Acupuntura como cuidado paliativo de pacientes com câncer colorretal

O câncer colorretal é um tumor que acomete o cólon (parte final do tubo digestivo) e o reto. Se detectado precocemente e antes de se espalhar para outros órgãos, as possibilidades de cura são altas. Grande parte desse tipo de câncer origina-se a partir de pólipos, que são lesões benignas que podem crescer na parede interna do intestino grosso. Os tumores em estadiamento inicial geralmente não apresentam sinais. Alguns casos de anemia em indivíduos acima de 50 anos podem ser um sinal de sangramento devido ao câncer colorretal.

Dores abdominais, alterações no hábito intestinal, percepção de uma massa abdominal, náuseas, vômitos, perda de peso, fraqueza e vontade constante de evacuar podem ser sintomas que normalmente se manifestam em estágios mais avançados da doença.

O tratamento depende da fase em que a doença encontra-se frente ao diagnóstico. Se estiver restrita ao intestino, inicia-se com a cirurgia (ressecção do sangramento de intestino acometido). A quimioterapia complementar (adjuvante) é indicada após a cirurgia em casos específicos. Se a doença é diagnosticada já em estados mais avançados (na presença de metástases), pode-se introduzir a quimioterapia antes da ressecção do tumor do intestino.

Uma dieta rica em vegetais e laticínios e pobre em gordura (principalmente a saturada), somada à realização de atividade física regularmente, ajuda na prevenção do câncer colorretal. Aconselha-se ainda evitar o consumo exagerado de carne vermelha e ficar atento aos fatores que aumentam o risco do desenvolvimento da doença, como idade acima de 50 anos, história familiar de câncer colorretal, de intestino, de ovário, de útero ou de mama e baixo consumo de cálcio, além de obesidade e sedentarismo. Outros fatores de risco são as doenças inflamatórias ou hereditárias no intestino.

Cuidados paliativos

Quando o tumor atinge um estadiamento muito alto e a doença avança intensamente a ponto de não existir mais a possibilidade de cura para o paciente, iniciam-se os cuidados paliativos, que se centram na qualidade e não na duração da vida. Oferece-se assistência humana e compassiva para as pessoas, durante as últimas fases da doença, para que possam viver o mais confortavelmente possível.

A filosofia dos cuidados paliativos aceita a morte como o estágio final da vida e não procura acelerá-la ou adiá-la. Por meio dos cuidados paliativos, trata-se a pessoa e não a doença, controlando os sintomas, para que os últimos dias de vida sejam dignos e com qualidade e para que esteja cercada por seus entes queridos. Essa filosofia, portanto, está também focada na família, incluindo-a, além do próprio paciente, na tomada de decisões.

O principal objetivo é melhorar a qualidade de vida do paciente, que decidirá junto com o seu médico e familiares quando se deve começar a realizar os cuidados paliativos.

Um dos problemas que podem surgir é que geralmente eles são indicados de forma tardia, sendo que às vezes o médico, o paciente ou um familiar rejeita a internação, porque acredita que dessa forma a pessoa está se “entregando” ou que não existe mais esperança. Mas se o paciente melhorar ou a doença entrar em remissão, ele terá alta e continuará a realizar uma série de ações contra o câncer em casa.

Práticas integrativas e complementares

No final da década de 1970, no intuito de estimular a criação de políticas direcionadas às práticas complementares, a OMS (Organização Mundial de Saúde) instituiu o Programa de Medicina Tradicional. Por meio de informes e resoluções, divulgou o seu interesse em impulsionar os Estados-membros a legislarem políticas públicas para o uso racional e integrado da medicina tradicional e complementar/alternativa nos sistemas nacionais de atenção à saúde. Ao mesmo tempo, foi incentivada a realização de estudos científicos, a fim de promover conhecimento sobre a segurança, eficácia e qualidade dessas terapias.

Em 2003, no Brasil, iniciou-se a construção da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC), com a finalidade de atender às diretrizes e indicações de várias Conferências Nacionais de Saúde e às recomendações da OMS. A PNPIC, no Sistema Único de Saúde (SUS), foi aprovada em fevereiro de 2006 e publicada na forma das Portarias Ministeriais nº 971, de 3 de maio de 2006 e nº 1.600, de 17 de julho de 2006.

Acupuntura no controle da dor e dos efeitos colaterais da terapia anticâncer

A medicina tradicional chinesa (MTC) é uma das práticas integrativas inseridas no SUS.

Ela preconiza que o corpo humano tem 12 meridianos principais por onde corre a energia vital (chamada Qi), que precisa estar equilibrada em suas duas polaridades naturais, yin e yang. A acupuntura atua na promoção desse equilíbrio.

Atualmente, as técnicas da medicina tradicional chinesa vêm sendo usadas como tratamento integrado de patologias crônicas, além das ortopédicas, neurológicas, reumatológicas e ginecológicas, ajudando na recuperação de funções, quando possível, ou como ação analgésica e/ou anti-inflamatória. Em pacientes com câncer ou em cuidados paliativos, é usada para controle da dor, ansiedade, fadiga, náusea e depressão e de efeitos colaterais produzidos pela radioterapia e/ou quimioterapia.

No tratamento do câncer, a acupuntura é aplicada no controle da dor e de sintomas de difícil manejo. Ela modula neurotransmissores envolvidos no mecanismo fisiológico da dor e de disfunções diversas, regulando circuitos neurais e ajudando na redução do uso de medicamentos. Isso acaba diminuindo sintomas comuns causados muitas vezes pela terapia anticâncer, como vômitos, constipação, boca seca, sofrimento psíquico, insônia e retenção de líquidos.

Um estudo realizado com 30 pacientes do SUS em Florianópolis mostrou que a maioria deles chegou à acupuntura na atenção secundária quando outros tratamentos falharam e em estágios avançados de adoecimento. Mesmo nesses casos, ela foi percebida pela maioria dos usuários com relativa eficácia sob vários aspectos, com melhoria de seus sofrimentos e quadros álgicos e redução do uso de medicamentos.

Apesar da dificuldade de acesso, já que poucos profissionais da atenção primária à saúde são acupunturistas praticantes, foi observado que estes possuem uma maior autonomia para atender os pacientes, podendo tratar por mais tempo casos mais graves. O ambiente da atenção primária à saúde parece favorecer o uso da acupuntura e de outras modalidades da MTC. Mas o acesso à acupuntura é precário e deve ser visto com cuidado pelos gestores, já que a lista de espera na atenção secundária tende a ser grande e lenta e os profissionais capacitados na atenção primária à saúde são poucos, com reduzido tempo disponível e dificuldades para a prática.

Os cinco elementos

Assim como a teoria do yin-yang, a teoria dos cinco elementos também constitui uma das bases da medicina tradicional chinesa. A teoria dos cinco elementos apresenta muitas facetas, já que eles representam cinco qualidades diferentes do fenômeno natural, cinco movimentos e cinco fases no ciclo das estações.

Segundo a passagem do Shang Sfu, “os cinco elementos são água, fogo, madeira, metal e terra. A água umedece em descendência, o fogo chameja em ascendência, a madeira pode ser dobrada e esticada, o metal pode ser moldado e endurecido e a terra permite a disseminação, o crescimento e a colheita. Aquilo que absorve e descende (água) é salgado, o que chameja em ascendência (fogo) é amargo, o que pode ser dobrado e esticado (madeira) é azedo, o que pode ser moldado e enrijecido (metal) é picante e o que permite disseminar, crescer e colher (terra) é doce”.

São essenciais para o conceito dos cinco elementos os vários inter-relacionamentos entre eles ao longo das sequências de geração, de controle, de excesso de trabalho, de lesão e de cosmologia. Os relacionamentos de geração e controle mútuos entre os elementos são processos autorreguladores de equilíbrio que podem ser encontrados na natureza e no organismo. A essência (Jing) dos relacionamentos dos cinco elementos está no equilíbrio: as sequências da geração e do controle mantêm um equilíbrio dinâmico entre os elementos. Quando esse equilíbrio é afetado durante um período prolongado de tempo, patologias podem ocorrer.

Cada elemento pode sair do equilíbrio de quatro maneiras: (1) está em excesso e superage sobre o outro ao longo da sequência do excesso de trabalho, (2) é deficiente, sendo lesionado por outro ao longo da sequência da lesão, (3) está em excesso e consome excessivamente do seu elemento-mãe, (4) é deficiente e falha para nutrir seu filho.

O modelo de correspondências dos cinco elementos é amplamente utilizado no diagnóstico, sendo baseado sobretudo na correspondência entre os elementos e odor, cor, sabor e som.

A teoria dos cinco elementos pode ser aplicada através do tratamento de acordo com várias sequências ou através do tratamento de acordo com os cinco pontos de transporte.

No tratamento de acordo com várias sequências, deve-se ter em mente os vários relacionamentos de um elemento com outros ao longo das sequências da geração, do controle, do excesso de trabalho, da lesão e da cosmologia.

Se o fígado estiver em excesso e o paciente apresentar sintomas e sinais de estagnação do Qi do fígado (Gan) ou do fogo do fígado (Gan), deve-se verificar se esse excesso é decorrente do metal (avó) falhando para controlar a madeira (neto). Isso acontece frequentemente na debilidade constitucional crônica do pulmão (Fei). Se o fígado (Gan) estiver em excesso por causa do elemento metal que não o controla, deve-se tonificar o metal [o pulmão (Fei)], assim como sedar o fígado (Gan). Se o excesso do fígado (Gan) estiver afetando e deprimindo o elemento terra, nesse caso o baço (Pi) requer a tonificação. Se o fígado estiver em excesso e retirando muito do seu elemento-mãe, deve-se também tonificar o rim (Shen).


Mari Uyeda – Mestre em Ciências da Saúde, nutricionista e professora do Departamento de Ciências da Saúde da Pós-graduação da Universidade Nove de Julho.