Antes de falar sobre medicina integrativa, é necessário alinhar alguns conceitos básicos sobre esse título, já que seu uso sofreu uma expansão muito rápida na última década e que, por ser de natureza abrangente, acabou abarcando temas às vezes díspares ou desconectados entre si.
De repente, tudo o que não se encaixava nos padrões ditos científicos ou estava fora dos currículos oficiais das faculdades de medicina passou a pleitear um lugar ao céu dentro das assim chamadas práticas integrativas, de modo que hoje é preciso esclarecer de que práticas exatamente estamos falando.
Esse conceito surgiu como um esforço da OMS (Organização Mundial de Saúde) para incentivar a pesquisa e o uso das medicinas tradicionais de diferentes culturas e descobrir maneiras de integrá-las ao repertório convencional, numa tentativa de ampliar o acesso à saúde para uma maior parcela da população.
No Brasil, o Ministério da Saúde lançou no início do século a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares, trazendo inicialmente para a rede pública a validação da acupuntura, da homeopatia, da medicina antroposófica, da fitoterapia e da crenoterapia (estudo e uso terapêutico das águas minerais). Inúmeras universidades ao redor do planeta têm se interessado pelo tema. Entre elas está a Universidade do Arizona, que abriga o Andrew Weil Center for Integrative Medicine, onde foram elencados oito princípios definidores do que seja a medicina integrativa, que a meu ver abarcam e resumem os pontos de convergência entre as diversas práticas.
1 – Pacientes e terapeutas são parceiros nos processos de cura.
2 – Todos os fatores que influenciam a saúde, o bem-estar e a doença são considerados e incluem a mente, o espírito e a cultura, além dos fatores somáticos.
3 – O uso apropriado tanto dos métodos convencionais quanto dos alternativos facilita as respostas fisiológicas inatas de cura.
4 – Intervenções efetivas que sejam naturais e menos invasivas deveriam ser preferencialmente usadas sempre que possível.
5 – A medicina integrativa não rejeita a medicina convencional e nem aceita sem prévia crítica as terapias alternativas.
6 – A boa medicina é baseada na boa ciência. É guiada por pesquisas e aberta a novos paradigmas.
7 – Além dos recursos de tratamento, conceitos mais amplos de promoção de saúde e prevenção de doenças são primordiais.
8 – Os praticantes de medicina integrativa devem agir de forma coerente com os seus princípios e comprometer-se com o autoconhecimento e autodesenvolvimento.
Promovendo a saúde e prevenindo as doenças
Na minha prática de 35 anos como pediatra antroposófica, com formação também em homeopatia, fitoterapia e medicina integrativa, o que mais valorizo nessa abordagem são os recursos que as medicinas complementares agregam aos da puericultura tradicional para a promoção da saúde e prevenção de doenças.
O acompanhamento do desenvolvimento da criança vai desde o pré-natal até os 18 ou 20 anos, que é quando se encerra o atendimento do hebiatra (médico de adolescentes) e quando os cuidados adequados nos campos da nutrição, sono, desenvolvimento neuropsicoemocional, atividade física, hábitos de vida e acompanhamento da vida escolar e social são implementados, reduzindo muito a probabilidade de desvios e adoecimentos de toda espécie.
Para Rudolf Steiner, fundador da antroposofia, toda doença, antes de se estabelecer fisicamente, é precedida por um estado de mau funcionamento, ou disfunção, que deveria ser harmonizado antes de se aprofundar e se converter em uma patologia.
Diferentemente do que acontece na abordagem convencional, em que se precisa esperar uma doença aparecer para depois diagnosticá-la e tratá-la, quando se trabalha com os conceitos da antroposofia, da homeopatia, da medicina tradicional chinesa e da medicina ayurvédica, pode-se identificar tendências constitucionais de desequilíbrio e harmonizá-las de forma sutil, antes que sintomas físicos se manifestem.
E se isso é feito nas fases iniciais da vida, tanto melhor, pois os bons hábitos, quando incorporados desde cedo, tendem a se perpetuar e retroalimentar os processos de cura.
Em resumo: a medicina integrativa tenta honrar o aforisma de Hipócrates, o patrono da medicina, que diz: primum non nocere (primeiro não prejudicar), ao mesmo tempo em que valoriza e incorpora as boas práticas e tecnologias convencionais, sempre com a busca da medicina baseada em evidências em todas as circunstâncias.
Dra. Rita de Cassia Lopes Rossini Rahme – Médica, especialista em pediatria pela AMB – Associação Médica Brasileira, pós-graduada em homeopatia, medicina tradicional chinesa, fitoterapia clínica e medicina integrativa. Presidente da Associação Brasileira de Medicina Antroposófica, no biênio de 2009/2011.