Ambiente familiar crítico e escolhas futuras: a ressignificação das primeiras experiências por meio da DBT

O adulto que quando criança sofreu negligência ou abuso emocional, físico ou sexual no ambiente familiar tende — entre outras coisas — a escolher um companheiro ou companheira que pratique as mesmas violências contra ele, comprometendo o equilíbrio nos relacionamentos íntimos.

Considerando que a negligência infantil está relacionada com falhas no atendimento às necessidades físicas e emocionais do infante, e o abuso infantil à prática de maus tratos contra ele, destaca-se que Melanie Klein (1882 – 1960), psicanalista austríaca e psicoterapeuta pós-freudiana, estudou diferentes dimensões psicanalíticas da criança, analisando as necessidades ou desejos desta e verificando o lugar ou influência do ambiente formado pela família — notadamente os pais — nas ocorrências da vida adulta do infante.

Klein interpreta essas ocorrências como possivelmente traumatizantes, esclarecendo que a criança parece introjetar que esses atos são o natural nos relacionamentos.

E sem saber expressar suas dificuldades com relação às vivências, quando adulta pode apresentar inibições graves, distúrbios de comportamento e outros, que denunciem a repetição do que introjetou, buscando por exemplo por parceiros que pratiquem contra ela os mesmos abusos ou negligências.

Ou seja, o ambiente familiar difícil é capaz de provocar um caos interno na criança, alterando as devidas interpretações, fantasias e imaginário sobre o corpo e a vida.

Quando adulta tudo isso se mistura e as vivências estarão de acordo com a experiência infantil, concretizando-se nas escolhas, relacionamentos, ações e capacidades. Dessa forma, sua realidade escapa-lhe por meio de seus impulsos ou pulsões.

Assim, foi por meio desse entendimento que Freud (1856 – 1939), neurologista austríaco e pai da psicanálise, já dizia que a subjetividade tem raízes na infância, porque o caráter interno e a moral formulados a partir desse período é herança do amor dos pais e vai originar o superego, ou seja, a instância da psique formada a partir das exigências e interdições parentais, e que vai atuar internamente como um juiz ou censor, estabelecendo regras e comportamentos.

Nessa instância da psique ficam depositados os desejos dos pais como sendo aquilo que é o ideal. E é conforme o que aprendeu ou assimilou na infância que se dará a maneira como o sujeito vai se constituir, sendo esse um processo inconsciente.

Consequências de um ambiente familiar desfavorável

O ambiente desfavorável para o desenvolvimento de uma criança é algo muito grave, merecendo citar exemplos e suas possíveis consequências.

Alguns deles são a falta de demonstração de afeto ou negligência emocional, ignorando os sentimentos da criança e deixando-a emocionalmente desamparada; a superproteção, em que os pais não deixam a criança tomar decisões e enfrentar desafios sozinha; a exposição a conflitos conjugais violentos, em que a criança presencia brigas intensas e agressões verbais ou físicas entre os pais; a rejeição ou preferência por outros irmãos; a cobrança excessiva por perfeição no que faz (notas altas na escola e intolerância a falhas, entre outras); o abuso sexual ou moral, em que a criança sofre abuso ou assédio por parte de um adulto, sem a proteção dos pais, ou até mesmo abuso por parte de um dos pais; a desvalorização dos sentimentos do infante, como por exemplo a situação em que a criança expressa emoções e os pais dizem que é “drama” ou que “não é nada”; as manipulações constantes ou responsabilização pelos problemas familiares, fazendo-a sentir-se culpada; as punições severas e a violência física, em que podem ocorrer humilhações e também as críticas excessivas e constantes ao infante.

Na vida adulta, tudo isso pode provocar baixa autoestima, autocrítica extrema, ansiedade social, medo de errar, dificuldades em expressar emoções, sensação de vazio, relacionamentos frios, dependência emocional, medo excessivo de autoridades, agressividade reprimida, tendência a relacionamentos abusivos, comportamento explosivo, falta de autonomia, insegurança para tomada de decisões, medo do fracasso, medo de se relacionar, tendência à repetição de padrões disfuncionais, dificuldade para confiar nos outros, sentimentos de inferioridade, busca constante por aprovação, ciúmes, competitividade nos relacionamentos, ansiedade, autossabotagem, medo de falhar, problemas de intimidade, depressão, traumas profundos, dissociação emocional, dificuldade para validar emoções, repressão emocional e tendência a atrair relações tóxicas, entre outras coisas.

Ou seja, não se esgotam aqui as consequências, mesmo porque por meio de cada uma delas são possíveis várias outras dificuldades no decorrer da vida.

Por esse motivo, ao reconhecer esses comportamentos e sentimentos faz-se necessária uma intervenção terapêutica, para promover uma reconstrução da identidade emocional e relacional, ressignificando os obstáculos ao bem-estar.

Relato de caso

Situações em que o adulto conviveu com críticas excessivas por parte dos pais na fase de infância vêm chamando a atenção na prática clínica pela frequência dos casos e via de regra pela descoberta da profunda relação de suas dificuldades psicológicas com tais críticas e até xingamentos vindos dos próprios pais.

Constitui, portanto, um abuso emocional utilizar palavras e proferir xingamentos com o intuito de maltratar psicologicamente uma criança. Faz parte disso repreendê-la por meio de gritos, desprezando suas capacidades e conquistas, praticando bullying e ameaçando ou assustando, já que isso a faz sentir-se desprezível, errada, com medo, em perigo e rejeitada por quem deveria amá-la ou até sentir que tem valor somente se satisfizer as necessidades de outras pessoas.

Nesse sentido, apresenta-se o caso de uma cliente de 41 anos de idade, que após prolongado tratamento com endocrinologistas, nutricionistas e esteticistas para ganhar massa corporal e aumentar volume em partes do corpo, não obteve sucesso, e, pelo contrário, passou a ter problemas de saúde no fígado e nos rins, não só devido à dieta adotada, mas também pelos remédios, implantes, preenchimentos, suplementos e polivitamínicos que utilizou durante o tratamento.

Por fim, sendo aconselhada pelo último médico consultado a deixar a dieta e o uso de medicamentos, porque do contrário sua saúde fatalmente pioraria, desanimou ainda mais com a vida.

Seu grau de depressão e ansiedade, que se arrastava por muitos anos, elevou-se ainda mais, sendo que ela teve que dobrar a dosagem de medicamentos psiquiátricos, devido à crise emocional que se instalou.

Entendendo que esse aumento na dosagem também prejudicaria seus órgãos, decidiu buscar tratamento por meio da decodificação biológica de traumas (DBT).

A DBT envolve uma minuciosa e profunda anamnese — desde tempos remotos de vida do cliente até chegar à atualidade — diagnóstico energético e tratamento por meio de micropressão nos pontos do microssistema dos pés — ambos obedecendo preceitos da medicina tradicional chinesa (MTC) e também o tratamento baseado nas cinco leis biológicas da nova medicina germânica (NMG). Trata-se, portanto, de um tratamento holístico e integrativo.

Por meio disso, verificou-se que a cliente, já em seu segundo casamento, viveu e vivia conflitos angustiantes dentro dos relacionamentos íntimos. Na atualidade, assim como no casamento anterior, seguia com um companheiro que fazia comentários depreciativos cotidianamente.

A última crítica que mais lhe doía era o fato de o marido mencionar que não adiantava ela usar roupas largas para esconder sua magreza, pois tudo o que ele sentia quando estava com ela eram ossos e que seria melhor não usar salto porque aumentar a altura dava a impressão de que ela era mais magra ainda. Mais tarde, já muito alterado pelo consumo de bebida alcoólica, ainda disse que quando se casaram ela tinha mais carne.

Não aguentando mais tanta tortura vinda do homem que escolheu para viver a seu lado, há meses fazia consultas e longos tratamentos, chegando ao quadro de saúde relatado.

Para além dos remédios, havia feito implantes de silicone e aplicações de bioestimuladores, utilizando até mesmo anabolizantes para ganhar massa.

E lembrou-se de que, quando adolescente, tomou muito biotônico Fontoura (um estimulante de apetite) com a esperança de engordar, já que em sua infância seus pais sempre comentavam sobre seu corpo ser pele e osso.

Uma vez ouviu quando a mãe disse às vizinhas que não sabia de quem a filha havia puxado aquele corpo magro e que não adiantava comprar calça jeans para ela, pois seu corpo não preenchia o espaço e ficava muito desengonçada. Lembrou-se de que por muitas vezes os pais a xingavam de Olívia Palito (personagem muito magra do desenho animado chamado Popeye).

A mãe sempre a obrigava a comer mais do que ela queria e uma vez, quando se negou a continuar comendo, foi obrigada a permanecer sentada à mesa de jantar enquanto não comesse tudo, sendo que ao final da noite a mãe enfurecida pegou arroz e enfiou na boca dela sufocando-a.

Lembrou-se também que, uma vez quando estava saindo da pré-adolescência, o pai comentou que dificilmente ela conseguiria um namorado devido a ser tão magra e que pelo menos nisso ela o ajudaria, já que assim não precisaria vigiá-la.

Em um desabafo profundo, disse que se pensar bem na sua infância estar com seu marido era o mesmo que estar sob o olhar de seus pais que sempre a criticaram, e que nunca teve ninguém para cuidar dela ou fazer-lhe um elogio. Diante da descarga emocional, houve ainda novas descobertas.

Combinando as questões emocionais relatadas com os demais problemas de saúde, foi possível estabelecer um diagnóstico energético preciso e definir um tratamento que a auxiliasse não só na desintoxicação orgânica, mas também melhora dos rins, fígado e outros órgãos envolvidos no processo de adoecimento, promovendo circulação harmoniosa das energias, dieta equilibrada, clareza de pensamentos, autoconhecimento e respeito por si, com ressignificações importantes sobre a relação com os pais, com o esposo, consigo mesma e com o próprio corpo, adquirindo forças para vencer a ansiedade e depressão.

Chega-se, portanto, à verificação do quanto o ambiente de infância é marcante e significativo para que o indivíduo consiga viver com plenitude e amor-próprio e sobre o quanto isso é relevante para a saúde mental e física, influenciando inclusive em escolhas importantes que reverberam por toda a vida. E também sobre como é possível, por meio da decodificação biológica de traumas, evitar que primeiras experiências negativas de vida determinem um destino.


Profa. Dra. Janine Soares Camilo – Ph.D. em Medicina Tradicional Indígena (Naturopatia e Homeopatia) pela Erich Fromm University, bacharel em Psicologia pela Fatra – Faculdade do Trabalho, master em Microsemiótica Irídea, bacharel em Cosmetologia e Estética pela Unitri – Universidade Integrada do Triângulo e pós-graduada em Acupuntura pelo IPGU – Instituto de Pós-Graduação de Uberlândia e em Homeopatia pela Faculdade Inspirar.

 

Referências bibliográficas

Ferreira, Francielle Henrique; Moreira, Camila Dias; Damasceno, Márcio Rocha. Traumas Infantis e seus Impactos na Vida Adulta. Anais do Seminário Científico do UNIFACIG, nº 8, 2022. Disponível em https://pensaracademico.unifacig.edu.br/index.php/semiariocientifico/article/view/3678/2808. Acesso em 6 de fev. 2025.

Fonte, R. F. Os reflexos da infância na vida adulta: uma revisão de literatura. 2017. Monografia (graduação). Faculdade de Odontologia de Araçatuba, Universidade Estadual Paulista; Araçatuba, 2017. Disponível em https://repositorio.unesp.br/server/api/core/bitstreams/f9ba04c8-d4aa-4a17-bc0aba15f3d36ba5/content. Acesso em 6 de fev. 2025.

Pekarsky, Alícia R. Visão Geral da Criança Maltratada. Manual MSD – versão para profissionais de saúde. 2022. Disponível em https://www.msdmanuals.com/pt/profissional/pediatria/crian%C3%A7a-maltratada/vis%C3%A3o-geral-da-crian%C3%A7a-maltratada. Acesso em 6 de fev. 2025.

Visentini, Danielle Machado. A clínica psicanalítica com crianças: um breve percurso. 2017. 32 f. Monografia (especialização). Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2017. Disponível em https://lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/169024/001046646.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em 6 de fev. 2025.