Aplicações da fitoterapia em câncer de pulmão

O câncer de pulmão é considerado como a principal causa de morte relacionada ao câncer, em termos mundiais, sendo que sua prevalência é também substancial. A Organização Mundial da Saúde já havia declarado que as taxas de mortalidade por câncer de pulmão continuariam a crescer, principalmente devido ao aumento no uso global de tabaco.

É uma doença caracterizada pela presença de sintomas como tosse, rouquidão, dificuldade em respirar, dor na região do peito (tórax) e emagrecimento. Apesar de sua gravidade, pode haver cura quando identificada e tratada precocemente, porém o mais comum é que o tumor seja descoberto em fase avançada da enfermidade, quando há menor chance de ser curado.

Os tratamentos para câncer de pulmão variam de acordo com o tipo de tumor, assim como sua classificação, tamanho, presença ou não de metástases e estado geral do paciente. Os mais comumente realizados são os descritos a seguir.

Cirurgias – efetuadas com o objetivo de retirada do tumor e dos gânglios linfáticos acometidos, a fim de evitar que as células tumorais espalhem-se. Subdividem-se em (1) lobectomia: quando um lobo inteiro do pulmão é retirado. É o tipo de cirurgia mais indicada, mesmo quando os tumores são pequenos, (2) pneumectomia: quando todo o pulmão é retirado, sendo indicada quando o tumor é grande e está localizado perto do centro, (3) segmentectomia: quando uma pequena parte do lobo pulmonar acometido é removida. Indicada para pacientes com tumores pequenos ou que estão com o estado de saúde fragilizado e (4) ressecção sleeve: não é muito comumente utilizada, sendo destinada à retirada de tumor que atinge a região dos brônquios, que são os tubos que levam ar para os pulmões.

Quimioterapia – tratamento normalmente usado para vários tipos de câncer de pulmão, tendo como objetivo a destruição das células cancerosas localizadas tanto no próprio pulmão como em outras partes do corpo (na ocorrência de metástases). Esse tipo de tratamento é feito através da aplicação de medicamentos por via venosa ou injeções, sendo que em alguns casos mais específicos utilizam-se comprimidos. Os medicamentos aplicados em quimioterapia foram desenvolvidos para destruir/interromper o crescimento de células cancerosas. Os mais usados são cisplatina, etoposídeo, gefitinibe, praclitaxel, vinorelbina ou vimblastina, podendo ser também aplicados em combinação e em outros tipos de tratamento, antes ou depois de cirurgia.

Imunoterapia – utilizada em alguns tipos de tumores em que há produção de proteínas específicas que impedem que as células de defesa do corpo destruam as células cancerosas. Os medicamentos que fazem parte da imunoterapia foram desenvolvidos para bloquear a ação dessas proteínas. Esses são alguns medicamentos que ajudam a imunidade do corpo a tratar o câncer de pulmão: atezolizumabe, durvalumabe, nivolumabe e pembrolizumabe. Atualmente, vários outros parecidos com esses estão sendo desenvolvidos e testados para tratar todos os tipos de câncer de pulmão. Os medicamentos aplicados em imunoterapia têm efeitos colaterais diferentes dos da quimioterapia, sendo que geralmente esses efeitos são mais fracos. No entanto, podem provocar cansaço, falta de ar e diarreia.

Radioterapia – também pode ser realizada em conjunto com outros tipos de tratamento, como a cirurgia para reduzir o tamanho do tumor, ou depois, para destruir as células tumorais que ainda podem existir.

Terapia fotodinâmica – pode ser utilizada nos estágios iniciais da doença, quando é preciso desobstruir as vias aéreas que estão bloqueadas pelo tumor. Essa terapia consiste no uso de medicamentos especiais injetáveis, com o objetivo de que eles se acumulem nas células tumorais. Após esse acúmulo, é aplicado um raio laser no local para matar as células, que depois são removidas por broncoaspiração.

Terapia a laser – é um tratamento usado em alguns casos de câncer de pulmão, principalmente se o tumor for pequeno. O laser é aplicado via endoscopia, através do broncoscópio, com a finalidade de destruir as células tumorais.

Ablação por radioterapia – utilizada em estágios iniciais da doença em substituição à cirurgia. Com a utilização de agulhas guiadas por tomografia computadorizada, de forma a se determinar a localização exata do tumor, aplica-se o calor produzido por ondas de rádio para matar as células tumorais.

Anorexia resultante de câncer de pulmão

A anorexia pode ser definida como perda do apetite, sendo um sintoma frequente em casos de câncer de pulmão, principalmente os diagnosticados em estadiamento avançado, estando presente em 30% a 40% dos pacientes em decorrência dos efeitos adversos do tratamento, como quimioterapia citotóxica e terapias direcionadas ou das comorbidades relacionadas à evolução da doença.

Esse sintoma levando à redução da ingesta alimentar e/ou inadequada absorção de nutrientes, causando piora no quadro clínico e na qualidade de vida dos pacientes e, consequentemente, aumento dos índices de morbidade e mortalidade.

Existem muitas causas de anorexia em quadros de câncer, sendo que, dentre elas, destaca-se como significativa o aumento de citocinas pró-inflamatórias e/ou de lactato. Esses fatores modulam as cascatas de neurotransmissores do sistema nervoso central que podem induzir a falta de apetite em pacientes com a doença.

A perda de peso não intencional que acontece no período de pré-tratamento pode ser consequência da anorexia e também está associada à piora da capacidade funcional e da tolerância ao tratamento. Cerca de 60% dos pacientes com câncer de pulmão avançado podem apresentar esse sinal, estando mais propensos a fadiga, dor e pior qualidade de vida.

A anorexia por si só é um fator prognóstico independente para a sobrevivência ao câncer. Atualmente, há dois medicamentos com evidência clínica de redução da anorexia em pacientes com câncer: acetato de megestrol (um derivado da progesterona) e glicocorticoides. No entanto, eles apresentam eventos adversos significativos. Em pacientes que estejam recebendo acetato de megestrol, são frequentemente observados edema, fenômenos tromboembólicos e mortes. E os que tomam glicocorticoides têm um risco maior de sofrer tromboembolismo venoso do que aqueles que tomam megestrol.

A anorexia afeta também a qualidade de vida dos pacientes em seu dia a dia. Portanto, os tratamentos para anorexia associada ao câncer devem ser avaliados quanto ao impacto que provocam na qualidade de vida e na sobrevida.

Os pacientes precisam de tratamentos seguros e eficazes para a anorexia associada ao câncer, como a fitoterapia. A medicina tradicional chinesa tem tratado a perda geral de apetite por um longo tempo. Existem vários estudos clínicos que compararam os efeitos da MTC aos do acetato de megestrol e os efeitos da fitoterapia associada à quimioterapia aos da quimioterapia isolada, os quais mostraram resultados promissores em relação à anorexia em pacientes com câncer de pulmão.

Plantas medicinais e fitoterápicos usados no combate ao câncer

Existem relatos de que, desde as sociedades primitivas, a fitoterapia acompanha a humanidade. Muitos povos já utilizavam plantas medicinais para curar doenças. Porém, é preciso ter cautela ao utilizar a fitoterapia, uma vez que o fato de um produto ser natural não significa necessariamente que esteja livre de efeitos colaterais.

Mercados internacionais registram um aumento expressivo na quantidade de fitoterápicos usados a cada ano, sendo que esse aumento supera o de medicamentos tradicionais ocidentais. Verifica-se que, enquanto o mercado mundial de medicamentos químicos cresce 4% ao ano, o de fitoterápicos avança em média 15% ao ano, garantindo um faturamento em torno de aproximadamente 22 bilhões de dólares. Acredita-se que, hoje, 25% de todas as prescrições mundiais são de fitoterápicos.

Estima-se também que aproximadamente 60% dos pacientes com câncer usam métodos alternativos de tratamento. Fatores como a falta de uniformidade no tratamento do câncer e a necessidade de reduzir a ansiedade dos pacientes oncológicos e deles retomarem o controle de sua saúde são apontados como as possíveis razões para eles busquem a medicina não convencional.

Pesquisas mostram cada vez mais o aumento do uso da fitoterapia como uma forma alternativa de tratamento de câncer em todo o mundo.

Na Europa, em estudos realizados em diferentes países e com diversos tipos de câncer, observou-se uma alta prevalência do uso de modalidades terapêuticas não convencionais por pacientes com cânceres de mama (44,7%), ginecológico (40,3%), colorretal (32%), hematológico (26,5%) e de pulmão (23,6%). A fitoterapia foi à modalidade mais utilizada em quatro dos cinco estudos, sendo que tal uso aumentou após o diagnóstico da doença.

Em um estudo conduzido nos Estados Unidos com indivíduos com e sem câncer, foi identificada a prevalência do uso de modalidades terapêuticas não convencionais por 40% dos indivíduos com câncer, dos quais 19,81% utilizavam a fitoterapia como principal modalidade de tratamento. Pacientes com câncer de mama no estádio 0-III, com tratamento oncológico anterior, demonstraram alta prevalência de uso de terapias não convencionais (79%), sendo que 50% deles faziam uso de plantas medicinais e/ou medicamentos fitoterápicos.

Existem muitos fitoterápicos usados como agentes anticancerígenos de sucesso, como por exemplo o Ginseng (Panax ginseng), cuja raiz vem sendo utilizada há milhares de anos em países da Ásia, o Ipê-roxo (Tabebuia avellanedae), cuja casca é usada por possuir atividades anti-inflamatórias, anticancerígenas, cicatrizantes e antibacterianas e o alho (Allium sativum L.), muito aplicado para o tratamento de diversas doenças, inclusive o câncer. Alguns medicamentos utilizados na quimioterapia são isolados a partir de plantas ou derivados naturais. Pode-se citar, dentre eles, a vimblastina e a vincristina. Essas substâncias são alcaloides isolados de Catharanthus roseus (L) G. Don. A vincristina é usada para casos de leucemia, enquanto a vimblastina é indicada em casos de câncer de mama, leucemia, linfoma, câncer de pulmão e testicular. Já, o taxol é uma substância quimioterápica isolada a partir da planta Taxus brevifolia, sendo usado principalmente no tratamento do câncer de ovário, mama e pulmão.

Os alcaloides também são utilizados, como os da vinca (vincristina, vindesina e vimblastina), provenientes da Lochnera rosea (L.) Rchb. ex K. Schum., conhecida popularmente como vinca rosa. A vimblastina é um medicamento antineoplásico e injetável, cuja ação consiste em inibir a divisão celular, de forma a impedir a proliferação de células cancerígenas pelo organismo.

O taxus brevifolia pode ser indicado como tratamento do câncer de não pequenas células em pacientes que não são candidatos a cirurgia ou radioterapia com potencial de cura, como tratamento de primeira linha.

Em estudos desenvolvidos no Brasil, foi identificado que os principais fitoterápicos utilizados no tratamento de câncer são o noni (M. citrifolia), cujo muco é relatado como tendo efeitos antitumorais e cujo fruto auxilia na prevenção e inibição da proliferação de tumores malignos, a babosa (A. vera), que apresenta substâncias que ajudam no manejo de reações adversas do câncer e a graviola (Annona muricata), que se mostrou eficiente no controle de células cancerosas.

Algumas plantas medicinais são também usadas para o controle dos efeitos colaterais de diversos tratamentos, como o alecrim (Rosmarinus officinalis L.), para alívio do mal-estar após as sessões de quimioterapia, o barbatimão (Stryphnodendron barbatiman Mart.), na cicatrização de feridas (câncer de pele) e a camomila (Matricaria chamomilla L.), para aliviar as queimaduras provenientes da radioterapia.

A aroeira (Schinus therenbithifolius Raddi) é indicada para combater tumores linfáticos entre várias outras enfermidades. O capim-santo (Cymbopogon citratus (D.C.) Stapf) apresenta atividade contra células leucêmicas, sendo citado em estudos como fortificante, digestivo, antigripal, analgésico, antitérmico, diurético, calmante, etc.

O irinotecan exibe significativa atividade contra os carcinomas gástrico, pulmonar, pancreático e cervical e ainda contra tumores do sistema nervoso central de grau elevado, linfomas e leucemia. O paclitaxel é indicado principalmente para tratamento do câncer de mama e de ovário, mas também pode ser utilizado em tumores epiteliais, como o do pescoço, esôfago e pulmão. O docetaxel é um análogo semissintético do paclitaxel, também aprovado para uso contra câncer de mama e de pulmão.

Concluindo, cabe considerar que, em razão da falta de evidências em relação à eficácia do uso de fitoterápicos no tratamento de câncer, ainda não se tem uma recomendação totalmente segura quanto à sua aplicação em pacientes oncológicos, pois podem contribuir para a ocorrência de interações medicamentosas e toxicidade, bem como comprometer a eficácia do tratamento convencional, recomendando-se a realização de mais estudos clínicos sobre sua eficácia, segurança e dosagem em pessoas com câncer.


Mari Uyeda – Coordenadora de Pesquisa no Centro de Oncologia Campinas –COC e professora e coordenadora de cursos de pós-graduação.

Karin Izabel Fitas Loureiro – Coordenadora de Pesquisa Clínica no Centro do  Câncer da Santa Casa de PiracicabaCECAN.