Em sua convivência tradicional com as plantas, os seres humanos foram descobrindo as qualidades de cada uma: alimento, medicamento, veneno, alucinógeno e outras, provavelmente pela experimentação intensiva e observação dos animais, mas igualmente por meio de impulsos instintivos, principalmente em comunidades indígenas.
Essa é a base da fitoterapia, termo apresentado pelo Dr. Henri Leclerc (1870-1955), médico francês, e que une dois radicais gregos: phyton, que significa planta e therapia, que significa tratamento ou prevenção de doenças.
Trata-se de uma técnica terapêutica em que utilizam as plantas medicinais e seus extratos, sem o isolamento de substâncias ativas e sem adição de qualquer substância isolada, mesmo que de origem vegetal.
A produção de fitoterápicos, portanto, é feita a partir de plantas e extratos concentrados das plantas medicinais (RDC nº 14/2010).
A seguir, serão definidos alguns dos principais conceitos utilizados nessa área de estudos.
Fitoterapia
Apesar de existirem conceitos gerais sobre o que é fitoterapia, a legislação brasileira estabeleceu um texto oficial, contido na RDC nº 14/2010, com a seguinte definição: “medicamento obtido empregando-se exclusivamente matérias-primas ativas vegetais. É caracterizado pelo conhecimento da eficácia e dos riscos de seu uso, assim como pela reprodutibilidade e constância de sua qualidade. Sua eficácia e segurança são validadas por meio de levantamentos etnofarmacológicos de utilização e documentações tecnocientíficas em publicações ou ensaios clínicos de fase 3. Não se considera medicamento fitoterápico aquele que, na sua composição, inclua substâncias ativas isoladas, de qualquer origem, nem as associações destas com extratos vegetais”.
Planta medicinal
Define-se planta medicinal como todo vegetal que contenha, em um ou mais de seus órgãos, substâncias que podem ser utilizadas para fins terapêuticos, preventivos e farmacêuticos ou que são precursores de síntese químico-farmacêutica.
É o ponto de partida do qual derivam os vários tipos de aproveitamento dessa matéria-prima no ramo farmacêutico.
E como todas as espécies da natureza apresentam compostos químicos, admite-se que todas as plantas são potencialmente medicinais, carecendo talvez de experimentação tradicional ou de estudos científicos modernos que revelem essa qualidade.
Droga vegetal
Define-se droga vegetal como sendo a planta medicinal inteira, assim como suas partes e secreções (ex.: resina, goma, látex), retirada da natureza de forma simples e que após sofrer processos de coleta, estabilização e secagem, guarda os princípios ativos de interesse medicinal e farmacêutico.
Pode apresentar-se comercialmente em forma íntegra, rasurada, triturada ou pulverizada.
O termo “droga” deriva de uma palavra de origem holandesa (droog) que significa “seco”. Assim, entende-se por droga a matéria-prima bruta, isto é, sem purificações ou manipulações sofisticadas, que se encontra no estado seco propício à conservação (Robbers et al., 1996).
Erros de tradução da palavra inglesa “drug”, que significa medicamento, disseminaram o termo droga no Brasil como sinônimo de medicamento, o que não é adequado e deve ser evitado.
Para complicar essas contradições, o termo droga ampliou seu significado para substâncias de ação no sistema nervoso central, como alucinógenos ou substâncias viciantes.
De todo modo, seu emprego na fitoterapia é clássico e mantém-se em plena utilização.
Princípio ativo
Princípio ativo é um conceito genérico sem precisão técnica, que se refere a uma substância ou a classes de substâncias, quimicamente caracterizadas, cuja ação farmacológica é conhecida e responsável, total ou parcialmente, pelos efeitos terapêuticos do fitoterápico.
Fitofármaco
Fitofármaco é a substância química presente nas plantas considerada em seu estado puro, isolado do conjunto de outras classes vegetais. Sua utilização farmacêutica não se classifica mais como um fitoterápico, pelo fato do isolamento e purificação desdobrar-se em efeitos distintos dos obtidos com a planta ou seus extratos.
Fitocomplexo
Fitocomplexo é o conjunto de substâncias químicas, originárias tanto do metabolismo primário das plantas (relacionado às funções essenciais das células vegetais em geral) quanto secundário (relacionado a funções que são especiais de determinados grupos de vegetais), responsáveis conjuntamente pelos efeitos terapêuticos tradicionais de uma determinada droga vegetal ou fitoterápico.
As substâncias que compõem o fitocomplexo podem ser genericamente subdivididas em princípio ativo principal (geralmente presente em maior quantidade ou avaliado, em estudos farmacológicos, como o mais potente ou o mais diretamente relacionado ao efeito terapêutico de interesse), princípios ativos secundários (outras substâncias da mesma classe do principal, mas com menor potência ou em menor concentração), outras classes de substâncias, que participam em conjunto com as anteriores e substâncias de pouca ou nenhuma atividade (ex: clorofila, proteínas, açúcares, lipídios, etc).
Essas substâncias existentes na planta podem atuar diretamente como ativos ou indiretamente de forma coadjuvante, promovendo sinergismo ou antagonismo, interação farmacocinética ou farmacodinâmica ou mesmo servindo como um excipiente entre as várias substâncias presentes no fitocomplexo.
O conceito de fitocomplexo significa entender que os elementos constituintes de uma planta, quando administrados separadamente, não possuem a mesma atividade que o conjunto administrado na sua globalidade.
Marcador
Marcador é o componente específico ou classe de compostos químicos presentes na matéria-prima vegetal, idealmente o próprio princípio ativo, e que preferencialmente tem correlação com o efeito terapêutico, utilizado como referência no controle de qualidade da matéria-prima vegetal e dos medicamentos fitoterápicos.
Extratos
Os extratos classificam-se, segundo sua consistência, em líquidos, sólidos ou semi-sólidos, sendo obtidos pela extração de drogas vegetais por meio de um líquido extrator adequado e métodos diversos (maceração, percolação, turbólise, etc.), seguido de concentração total ou parcial do solvente.
O processo de concentração visa a aumentar o teor de sólidos, com a finalidade de alcançar um determinado resíduo seco definido na monografia, aumentar a concentração do marcador com o objetivo de diminuir o volume a ser ingerido e/ou eliminar substâncias indesejáveis sem relação com o efeito esperado.
Padronização dos extratos
A padronização dos extratos é uma exigência técnica e legal para que se possam estabelecer as necessárias relações de doses para os efeitos terapêuticos adequados.
Quando se utilizam extratos sem padronização ocorre grande variabilidade química de um lote a outro em decorrência da heterogeneidade dos lotes da própria planta, sem a garantia da presença dos ativos nas concentrações necessárias para obtenção dos efeitos terapêuticos com ausência de toxicidade.
Para atender a tal necessidade, foram desenvolvidas duas formas de realizar-se a padronização dos extratos: via ED ou com a expressão quantitativa por marcadores.
Em relação à concentração expressa pelo conceito de ED – relação extrato/droga ou ratio, Gaedcke e colaboradores (2003) o definem como “a proporção da massa de droga vegetal (material de partida) em relação à massa do extrato final”.
Tal conceito é ponto-chave no entendimento da concentração dos fitoterápicos e, desse modo, a própria Anvisa incluiu uma definição a respeito na RDC nº 14/2010: relação “droga vegetal: derivado vegetal” é a expressão que define a relação entre uma quantidade de droga vegetal e a respectiva quantidade de derivado vegetal obtida. O valor é dado como um primeiro número, fixo ou na forma de um intervalo, correspondente à quantidade de droga utilizada, seguido de dois pontos (:) e, depois desses, o número correspondente à quantidade obtida de derivado vegetal”.
Por exemplo: um extrato de formato ED 3:1 empregaria três partes da droga vegetal para produzir uma parte do extrato seco ou mole. No entanto, como ocorrem variações de teores de ativos e de sólidos nos lotes de drogas vegetais, é usual encontrar-se EDs em faixas (ex.: 2 a 3:1), mostrando possíveis ajustes, a maior ou a menor, em relação à quantidade da droga vegetal inicial, para que o produto final apresente o teor planejado e desejado. A faixa de ED expressa, portanto, os esforços dos fabricantes de extratos para chegar ao mesmo resultado final partindo de lotes de matéria-prima (droga vegetal) com distintos teores de ativos, como de fato ocorre na prática comercial e industrial.
Já os extratos padronizados quimicamente seguem a mesma conceituação anterior, mas partem da quantificação exata dos marcadores presentes na matéria-prima vegetal e seu resultado no extrato. Assim um lote de droga contendo 1% de marcador, ao ser preparado na forma ED 3:1, gera um extrato seco ou mole com 3% de marcador, exatamente quantificado.
De acordo com as normas brasileiras, esses dois formatos precisam ser ajustados, isto é, pode-se produzir o extrato no formato ED, mas deve-se avaliar o teor de marcador final de modo quantitativo, atendendo-se assim aos requisitos de qualidade necessários para fitoterápicos.
Cecilia E. F. Ognibene – Farmacêutica.
Luis Carlos Marques – Farmacêutico, com especialização em Fitofármacos e Fitoterápicos, mestrado em Botânica e doutorado em Psicobiologia.
Nota: artigo baseado em Introdução à Fitoterapia Científica. Disponível em https://wzukusers.storage.googleapis.com/user-33404663/documents/5b158371a86d84Bo7N7x/22.%20Material%20de%20divulga%C3%A7%C3%A3o%20-%20fitoterapia%20cient%C3%ADfica%20Eurofarma.pdf
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