Respirar pelo nariz estimula áreas do cérebro relacionadas à memória, emoção e olfato.
Por meio da respiração, estamos eternamente ligados a algo que transcende a Criação, que está além da forma. A respiração é o cordão umbilical através do qual a vida flui para nós. É nisso que reside sua grande importância. É a respiração que nos liga continuamente a tudo que existe. Começamos a vida com nossa primeira respiração, terminamos a vida num último suspiro.
Na tradição milenar do leste, o ato de respirar é um aspecto essencial da maioria das práticas de meditação e é considerado um fator crucial para se alcançar o estado meditativo da consciência, ou “samadhi”. A respiração é chamada de “prana”, que significa “respiração” e “energia” (isto é, o campo consciente que permeia todo o universo).
A respiração é um fenômeno rítmico. Ela se compõe de duas fases: a inspiração e a expiração. Nós, seres humanos, respiramos continuamente durante todo o nosso tempo de vida, em geral 18 vezes por minuto, 1.080 vezes por hora e 25.920 vezes por dia.
Mas respirar é um ato inconsciente realizado apenas em resposta à necessidade fisiológica de troca de gases?
Sincronia entre atividade cerebral e respiração
Segundo um novo estudo realizado na Universidade Northwestern, nos EUA, liderado pela Dra. Christina Zelano, a respiração não serve apenas para encher os nossos pulmões de ar e permitir a troca de gases com o meio ambiente, mas também afeta o nosso pensamento e o funcionamento cerebral.
De acordo com o trabalho publicado na Revista The Journal of Neuroscience, o ritmo da respiração cria atividade elétrica no cérebro humano, e os efeitos são diferentes dependendo se respiramos pela boca ou pelo nariz.
Os cientistas analisaram dados da eletroencefalografia de sete pacientes com epilepsia, depois de implantarem eletrodos nos cérebros dos indivíduos. Os dados mostraram que a atividade cerebral parece estar em sincronia com a respiração.
A atividade cerebral dos pacientes foi observada em três regiões do cérebro – o córtex piriforme, que processa cheiros, o hipocampo, que controla a memória, e a amígdala, que está ligada ao processamento de emoções.
Uma das principais descobertas desse estudo é que há uma diferença dramática na atividade cerebral na amígdala e do hipocampo durante a inspiração quando comparada com a expiração.
Na experiência realizada durante o estudo, os participantes sentaram-se à frente de um computador e, usando uma máscara respiratória, tinham que classificar imagens que exibiam expressões de medo ou de surpresa.
Assim que as fotografias apareciam, os indivíduos tinham de selecionar uma das duas emoções o mais rápido possível. O objetivo era analisar como é que a amígdala – que está relacionada com a interpretação de expressões faciais – é afetada pela respiração. A amígdala está fortemente ligada ao processamento emocional, em particular emoções relacionadas ao medo.
Segundo os especialistas, os resultados da investigação revelaram que os participantes selecionaram a opção correta mais rapidamente quando inspiraram apenas pelo nariz.
Os cientistas realizaram outra experiência que testou a memória de 42 participantes, medindo a atividade no hipocampo. Os voluntários observaram imagens de certos objetos no computador e, depois, tinham que se recordar deles.
De acordo com os resultados desse teste, os voluntários conseguiram relembrar melhor os objetos quando inspiraram pelo nariz.
O estudo sugere que as nossas habilidades cognitivas melhoram com a inspiração nasal. Os efeitos desaparecem se a respiração for pela boca.
Respiração focada
Outro insight potencial da pesquisa é sobre os mecanismos básicos de meditação ou respiração focada. Ao inspirar pelo nariz, a pessoa está, de certo modo, sincronizando oscilações cerebrais na rede límbica através do córtex olfativo, promovendo relaxamento e um sincronismo importante entre a frequência respiratória e cardíaca, pressão arterial e outras funções oscilatórias, como imunológica e hormonal.
Várias técnicas respiratórias têm como alvo a frequência de seis respirações por minuto (0,1 Hz). Essa frequência maximiza a variabilidade da frequência cardíaca (medida do tempo entre dois batimentos cardíacos consecutivos) e melhora drasticamente a sincronização cardiorrespiratória.
A respiração nasal lenta promove também alterações mecânicas e pulsáteis no fluxo sanguíneo e no liquor, evocando sincronia cerebral generalizada e um amplo recrutamento de circuitos neurais.
Curiosamente, as práticas religiosas e artísticas também podem facilitar a sincronização cardiorrespiratória de 0,1 Hz e podem ter evoluído para promover um sentimento de bem-estar que os indivíduos associariam a essas práticas. Por exemplo: o tempo de repetição da Ave Maria na oração do rosário e dos mantras de ioga circula a ± 0,1 Hz e produz sincronização cardiorrespiratória.
Respiração e consciência
A prática respiratória consciente é a chave para a compreensão da natureza interdependente do eu físico, mental e espiritual. Quando a humanidade começar a prestar mais atenção na respiração e no relacionamento com o desenvolvimento e a expressão da consciência humana, surgirão muitas revelações que irão alterar o modo pelo qual as doenças humanas serão entendidas e tratadas pelos médicos e terapeutas do futuro.
Alessandra Busse Ferrari – Fisioterapeuta integrativa, especialista em Geriatria e Gerontologia e sócia do Instituto de Reabilitação Respiratória desde 1998. Pesquisadora do tema respiração e espiritualidade.