Auriculoterapia: a mais conhecida das terapias chinesas aplicadas em pediatria

A acupuntura é um dos cinco pilares que compõem a estrutura da medicina tradicional chinesa. Difundida como uma terapia em que se utilizam agulhas nos canais fisiológicos do sistema médico chinês pelo corpo, poucos têm conhecimento sobre suas outras formas de aplicação, como a acupressão (pressão nos pontos de acupuntura), geralmente feita com os dedos e com o uso de instrumentos que podem ser apalpadores, esferas metálicas, esferas de cristal, sementes ou outro tipo de meio para estimulação.

Além das formas variadas de aplicação da acupuntura sistêmica, existem meios de alcançar objetivos similares através dos microssistemas de acupuntura.

Microssistemas são partes reduzidas do corpo que representam o todo, funcionando por meio de sistema reflexo, como por exemplo microssistema da mão (acupuntura coreana – Koryo Sooji Chim), microssistema da cabeça (craniopuntura), microssistema lingual, microssistema ocular, microssistema umbilical e microssistema da orelha, dentre outros.

Embora sejam ramificações da acupuntura sistêmica, os microssistemas possuem autonomia de tratamento e, com exceção da auriculoterapia, em que são aplicadas outras formas de estimulação, em todos os demais utilizam-se agulhas.

E é justamente a exceção na utilização de agulhas para aplicação do tratamento que faz da auriculoterapia uma prática tão aceita entre as pessoas que possuem receio e, principalmente, entre as crianças.

Auriculoterapia: uma prática milenar

A Organização Mundial de Saúde (OMS) reconheceu, em 1990, o valor da auriculoterapia como uma prática eficaz para o diagnóstico e tratamento de diversas condições físicas e emocionais.

Pode ser encontrada em diversas literaturas com as nomenclaturas de auriculomedicina, acupuntura auricular, auriculopuntura e aurículo, sendo que todas elas se referem ao sistema de diagnóstico e tratamento via pavilhão auricular por estimulação reflexa: orelha x corpo / corpo x orelha, ou seja, as patologias do corpo podem ser reconhecidas no pavilhão auricular e por via reflexa, no pavilhão auricular, estimulando-se o ponto correspondente, é alcançado o reequilíbrio físico ou mental.

É possível encontrar menção à auriculoterapia em escritos de 2.500 a.C., no Egito, utilizada como método contraceptivo, em 400 a.C., citada por Hipócrates e em 27 a.C., na China, já como forma associada à acupuntura sistêmica.

Foi na década de 1950 que o médico francês Paul Nogier interessou-se pelo tema e explorou o estudo da auriculoterapia, catalogando e sistematizando os pontos, de forma a transformá-la em um sistema próprio de diagnóstico e tratamento.

A partir daí, a auriculoterapia expandiu-se para diversos países, onde foram intensificados os estudos e registros, culminando na elaboração de diversas doutrinas que partem do mesmo princípio do sistema reflexo do pavilhão auricular: auriculoterapia francesa (Dr. Paul Nogier), auriculoterapia chinesa (Profa. Huang Li Chun), auriculoterapia brasileira (Prof. Marcelo Pereira de Souza), cristais radiônicos (Prof. Raul Breves) e meridianos na orelha (Prof. Célio Pasqua), dentre outras linhagens.

Vantagens e facilidades no uso da auriculoterapia

As principais vantagens que tornam o microssistema da auriculoterapia tão popular são a possibilidade de utilização de sementes, esferas e cristais em vez de agulhas; a facilidade de acesso que a orelha permite, não sendo necessária troca de vestimenta e nem maca apropriada; a facilidade de aprendizado e memorização devido à similaridade anatômica da orelha com o corpo humano; o fato de ser um investimento de baixo custo; a possibilidade de aplicação sem restrição de idade; a vantagem de poder ser associada a outras terapias em conjunto e o fato de o tratamento ser prolongado em casa.

Outra facilidade é que, apesar de pertencer a um sistema médico próprio e complexo, a auriculoterapia pode ser aplicada por qualquer pessoa habilitada, independentemente do estudo dos princípios da medicina chinesa, como por exemplo por famílias que tenham intenção de utilizar meios naturais para os problemas comuns do dia a dia.

Como a auriculoterapia atua

 A principal descoberta que tornou a auriculoterapia um microssistema válido foi a representação do corpo humano no pavilhão auricular como um feto em posição cefálica. A partir daí, cada parte do corpo humano corresponde a uma localização específica na orelha, como se pode ver nas Figuras 1 e 2.

Uso da auriculoterapia em pediatria
Figura 1 – Representação do corpo humano no pavilhão auricular. Fonte: arquivo da autora.
Uso de auriculoterapia em pediatria
Figura 2 – Divisão anatômica. Fonte: arquivo da autora.
Auriculoterapia em pediatria
Figura 3 – Representação simplificada da divisão por regiões correspondentes. Fonte: arquivo da autora.

Como se pode observar, a auriculoterapia tem uma aplicação simples e direta, sendo que sua efetividade em casos de dor já foi comprovada, com redução imediata de no mínimo 70%.

Na pediatria integrativa, os terapeutas utilizam amplamente a técnica de auriculoterapia, sendo visualmente fácil de ensinar os pais para acompanhamento domiciliar.

Atendimento e cuidados

O atendimento com auriculoterapia passa pelas seguintes etapas: avaliação/anamnese, observação dos aspectos do pavilhão auricular, palpação (exploração manual), massagem, higienização, sangria e aplicação dos pontos.

No procedimento, a sangria de ápice tem função anti-inflamatória, de analgesia, de melhoria do sistema imunológico, antialérgica, antipirética, dispersante, de melhoria da qualidade do sono, de melhora de questões oculares, calmante e de redução de episódios de ansiedade e hiperatividade.

As contraindicações da auriculoterapia não representam um risco à saúde em si, sendo mais cuidados que devem ser observados por parte do profissional que está aplicando a terapia, tais como não colocar estímulos sobre lesões, não proceder o tratamento em paciente que utiliza anticoagulante e, no caso de gestantes, não utilizar os pontos do útero, do ovário, endócrinos, da hipófise e da região abdominal.

No procedimento de auriculoterapia infantil, as contraindicações são as mesmas já citadas. Porém, a aplicação da técnica exige a atuação de um profissional que esteja alinhado com as especificidades de cada fase do desenvolvimento infantil físico, intelectual e mental, uma vez que os processos naturais de crescimento e desenvolvimento devem ser respeitados. Isso reforça a necessidade de aplicação por um profissional habilitado, mantendo a máxima de “não é porque é natural, que não faz mal”.


Marina Martinho – Pedagoga formada pela Universidade de São Paulo, professora de Medicina Chinesa e Acupuntura, dietoterapeuta, especialista em Pediatria Integrativa e pesquisadora na área de terapias tradicionais.