Escalas homeopáticas e métodos de dinamização: importância do investimento em pesquisas

A racionalidade terapêutica homeopática considera crucial a questão dos medicamentos. Samuel Hahnemann, alemão que sistematizou os conhecimentos médicos produzidos até sua época, desenvolvendo uma terapia do sujeito, estabeleceu o que posteriormente foi denominado de Quatro Leis da Homeopatia: semelhante cura semelhante, experimentação em indivíduos sãos, medicamento único e doses mínimas e infinitesimais.

Quando se analisa esses princípios, percebe-se a importância dada ao preparo e administração dos medicamentos, já que todas as quatro leis abordam a lógica de como concebê-los, produzi-los e utilizá-los.

Ao longo dos anos, novas formas de manipular os medicamentos homeopáticos foram elaboradas, tanto para atender a necessidades comerciais e/ou de distribuição quanto para tentar aprimorar a técnica, sendo necessário o incentivo às pesquisas científicas para se verificar a diferença de ação entre esses diversos tipos de medicamento.

Sucussão e dinamização

A ideia de que as altas concentrações de substâncias medicamentosas poderiam ser muito tóxicas aos doentes, causando iatrogenia, já era discutida na época de Hahnemann8, que se apropriou desse conhecimento e o aprimorou, criando diluições altíssimas que, segundo a constante de Avogadro conhecida atualmente, não contêm traços químicos de matéria.

A sucussão, processo utilizado na homeopatia para a dinamização dos medicamentos, visava a extrair a força medicamentosa das substâncias. Com as recentes descobertas da física quântica, pode-se dizer que as sucussões permitem aumentar a força do campo eletromagnético dos medicamentos, que assim podem atuar mais eficazmente nos campos eletromagnéticos dos doentes(7).

Nesse sentido, as dinamizações (o verbo dinamizar vem da raiz grega dynamis – força e potência!) cumprem duas funções: reduzir a toxidade e potencializar o efeito do medicamento.

Escalas homeopáticas

Durante sua prática, Hahnemann desenvolveu duas escalas homeopáticas: centesimal e cinquenta milesimal. Essa última foi elaborada nos últimos anos de sua vida, em que ele já estava na França e publicada na sexta edição do Organon.

Nessa edição, Hahnemann esclarece que a nova escala foi desenvolvida para tornar mais suave e seguro o processo de cura homeopático, com possibilidade de repetição de doses diárias e agravamentos mais sutis e rápidos(4).

A escala cinquenta milesimal utiliza um processo de dinamização diferente da centesimal: todas as drogas, independentemente de sua solubilidade, são trituradas antes das diluições, método provavelmente aprendido com os árabes e que permite aproveitar todos os componentes da substância utilizada. Para as diluições, Hahnemann pipetava parte da diluição anterior para produzir a seguinte em novo frasco.

Korsakov, médico de guerra russo contemporâneo de Hahnmemann e um de seus correspondentes, desenvolveu um método mais prático e fácil para situações de locomoção em grandes distâncias: utilizava apenas um frasco para diluição e sucussão, esvaziando-o e completando com mais solvente para as diluições seguintes.

Em 1833, Hering, médico estadunidense, criou a escala decimal que dilui menos os fármacos(2).

Depois da morte de Hahnemann e sob a revolução industrial que incentivava a automação dos processos de produção, foram desenvolvidos vários dinamizadores que além de reduzir os custos também se pretendiam mais práticos e rápidos.

Atualmente, as máquinas de fluxo contínuo estão disseminadas pelo Brasil e nos demais países.

No Brasil, na década de 1990, o médico paranaense Javier Salvador Gamarra desenvolveu uma nova escala homeopática, a SD (superdiluição ou super dilution), que não foi regulamentada e ainda está sob pesquisa(1), com alguns resultados positivos(6).

Segurança e eficácia dos medicamentos homeopáticos

Frente a tantas formas diferentes de manipular os medicamentos homeopáticos, é salutar que se discuta como cada uma delas funciona e qual sua eficácia terapêutica.

Para tal, é preciso esclarecer como foram e têm sido construídas as matérias médicas homeopáticas que dão subsídio para a escolha dos medicamentos.

As matérias médicas possuem indicação de sintomas produzidos por intoxicações ponderais e também sintomas produzidos por drogas dinamizadas à 30ª potência centesimal.

Médicos e terapeutas escolhem os medicamentos homeopáticos baseando-se nessas patogenesias. Porém, cada um deles prefere uma escala específica e muitas vezes ficam à mercê dos processos de dinamização disponíveis nas farmácias a que têm acesso.

Até que ponto as alterações dinâmicas produzidas pelos medicamentos dispensados em escala decimal podem ser equiparadas às alterações dinâmicas produzidas pelas centesimais?

E ainda, como é possível traçar equivalências entre as escalas, sendo que até Hahnemann, há 200 anos, já percebia que os efeitos de uma centesimal eram bastante diferentes de uma escala cinquenta milesimal?

Na prática, parece que há resultados positivos de todas as escalas e segundo alguns autores cada uma delas é útil em um tipo específico de adoecimento(5).

Mas são necessárias pesquisas patogenéticas e clínicas para podermos ter mais segurança sobre os efeitos dos medicamentos homeopáticos.

Adendo

Conceitos e definições de termos utilizados no artigo, com base na Farmacopeia Homeopática Brasileira/2016.

Diluição – redução da concentração do insumo ativo pela adição de insumo inerte adequado.

Dinamização – a resultante do processo de diluições seguidas de sucussões e/ou triturações sucessivas do insumo ativo em insumo inerte adequado.

Droga – matéria-prima de origem mineral, vegetal, animal ou biológica, utilizada para preparação do medicamento homeopático.

Escala – a proporção entre o insumo ativo e o insumo inerte empregada na preparação das diferentes dinamizações. As formas farmacêuticas derivadas são preparadas segundo as escalas centesimal, decimal e cinquenta milesimal.

Escala centesimal: preparada na proporção de 1/100 (insumo ativo/insumo inerte).

Escala decimal: preparada na proporção de 1/10 (insumo ativo/insumo inerte).

Escala cinquenta milesimal: preparada na proporção de 1/50.000 (insumo ativo/insumo inerte).

Medicamento homeopático – toda forma farmacêutica de dispensação ministrada segundo o princípio da semelhança e/ou da identidade, com finalidade curativa e/ou preventiva. É obtido pela técnica de dinamização e utilizado para uso interno ou externo.

Potência – indicação quantitativa do número de dinamizações necessárias para a obtenção do medicamento homeopático.

Sucussão – processo manual que consiste no movimento vigoroso e ritmado do antebraço contra um anteparo semirrígido, do insumo ativo dissolvido em insumo inerte adequado. Pode ser também realizado de forma automatizada, desde que simule o processo manual.

Trituração – redução do insumo ativo a partículas menores por meio de processo automatizado ou manual, utilizando lactose como insumo inerte, visando a dinamizar o mesmo.


Patricia Stumpf – Nutricionista, pós-graduada em acupuntura, shiatsuterapeuta, homeopata, coordenadora do Curso de Acupuntura da ASBAMTHO – Associação  Sino Brasileira de Acupuntura, Moxabustão e Terapias Holísticas e coordenadora das PICs nas Academias da Saúde do SUS, em Petrópolis, no Rio de Janeiro.

 

Fontes

1 – AMHPR (Associação Médica Homeopática do Paraná). 21 Novembro – dia da homeopatia no brasil homenagem ao mestre Gamarra. Disponível em: http://www.bvshomeopatia.org.br/texto/21NovembroDIAHomeopatiaBrasilHomenagemJavierSalvadorGamarraAMHPR.htm. Acessado em: 20/10/2016.

2 – Cesar, Amarilys. Dinamização, a mágica de Hahnemann. Disponível em: http://www.hncristiano.com.br/hnc/homeopatia-artigos/83-dinamizacao-homeopatica-magica-hahnemann. Acessado em: 20/10/2016.

3 – Farmacopeia homeopática brasileira. Disponível em: http://www.anvisa.gov.br/hotsite/farmacopeiabrasileira/conteudo/3a_edicao.pdf Acessado em: 20/10/2016.

4 – Hahnemann, Samuel. Exposição da doutrina homeopática ou Organon da arte de curar. Ed. GEHSP Benoit Mure, 2013.

5 – Jurj, Gheorghe; Waisse, Silvia. Clínica homeopática praática – fundamentos da prática em tempo real – radicais e famílias. Ed. Organon, 2011.

6 – Parizotto, Angela Valderrama; Oliveira, Carlos V. P. de; Moreira, Flavia C.; Silva, Hingrid A.; Zibetti, Ana P.; Reis, Bruno; Lolis, Maria I. G. A.; Gamarra, Javier Jr. Bonato, Carlos Moacir.  Efeito do medicamento sulphur ultradiluído na germinação e crescimento inicial de Sorghum bicolor L. Moench. Disponivel em: http://www.eaic.uel.br/artigos/CD/3766.pdf. Acessado em: 20/10/2016.

7 – Tripicchio, Adalberto. Homeopatia quântica parte II. Disponível em: http://www.redepsi.com.br/2008/07/04/homeopatia-qu-ntica-parte-ii/. Acessado em: 20/10/2016.

8 – Waisse, Sílvia. Hahnemann – um médico de seu tempo. Ed. EDUC, 2005.