Diabetes Mellitus: efeitos e adversidades do tratamento com ervas

A diabetes mellitus pode ser definida como uma doença endócrina, em que os níveis de glicose no sangue estão acima do normal. Existem três tipos principais de diabetes, como descritos a seguir.

Diabetes do tipo I: é também conhecida como diabetes juvenil, pois acomete crianças e adolescentes, concentrando de 5% a 10% do total de pessoas portadoras da doença. Nesse caso, as células β do pâncreas não produzem insulina suficiente.

Diabetes do tipo II: surge mais comumente em adultos acima de 30 anos, quando o corpo passa a ter resistência à insulina, perdendo sua capacidade de responder aos efeitos do hormônio. Está associada ao excesso de peso e é responsável por aproximadamente 90% a 95% de todos os casos de diabetes.

Diabetes gestacional: desenvolve-se geralmente a partir do final do segundo trimestre de gravidez, devido a uma resistência à insulina provocada pelos hormônios da gestação, desaparecendo depois do parto.

O tratamento da diabetes deve ser feito com base no uso de medicamentos (injetáveis ou não), assim como na realização de atividade física, controle do peso, alimentação adequada e não uso de tabaco. Mas os medicamentos utilizados podem ter alguns efeitos colaterais, como náuseas, diarreia, hipoglicemia, excesso de gases, aumento de peso, falta de apetite e infecção urinária.

As ervas hipoglicemiantes são amplamente utilizadas como tratamento da diabetes, apesar de poucos estudos sobre seus efeitos terem sido realizados, devido a inúmeras diferenças climáticas e territoriais que podem acontecer no cultivo de cada espécie. É importante ressaltar que cada erva contém milhares de componentes, mas somente alguns são terapeuticamente eficazes. O método de extração também pode produzir diferentes ingredientes ativos, lembrando-se ainda que a mistura de ervas pode ter efeitos sinérgicos.

Ervas utilizadas no tratamento de diabetes

Ginseng – sua potência terapêutica depende principalmente da localização geográfica de sua procedência, da dosagem, do processamento e do tipo de diabetes para o qual esteja sendo utilizado.

O Panax ginseng (ginseng chinês ou coreano) é o que tem maior potencial terapêutico. O Panax quinquefolius (ginseng americano) é considerado como de média potência. E o Panax japonicus (ginseng japonês) é classificado como de baixa potência.

O ginseng terapêutico mais usado é o Panax ginseng, que tem demonstrado atividades antitumorais, angiomoduladoras e semelhantes às de esteroides. Apesar de sua raiz e fruto possuírem efeitos antidiabéticos, o fruto parece ser mais potente na atividade anti-hiperglicemiante, produzindo também efeitos antiobesidade acentuados.

O tratamento com ginseng Panax quinquefolius para diabetes do tipo II mostrou aumento de peso corporal e diminuição dos níveis de colesterol e da glicemia pós-prandial.

Em pacientes com diabetes do tipo I, os ginsenosídeos inibem a apoptose das células β induzida por citocinas. O mecanismo de ação envolve a redução do óxido nítrico, produção de espécies reativas de oxigênio, inibição da expressão de p53/p21 e inibição da clivagem de caspases e poli (ADP- ribose) polimerase (PARP).

O ginseng não apenas ajuda no controle da glicose sérica em pacientes diabéticos, mas também auxilia nas complicações do sistema nervoso central. A expressão alternada do gene NOS está implicada na patogênese de numerosas complicações secundárias em pacientes diabéticos. Estudos farmacológicos confirmaram que o ginseng possui múltiplas ações (no sistema nervoso central e efeitos neuroprotetores, imunomoduladores e anticâncer). Os ginsenosídeos têm propriedades antioxidantes, anti-inflamatórias, antiapoptóticas e imunoestimulantes.

Os efeitos colaterais do ginseng incluem insônia, diarreia, sangramento vaginal, dor nas mamas, dor de cabeça intensa, esquizofrenia e síndrome de Stevens-Johnson fatal.

Momordica charantia (melão amargo) – seus componentes antidiabéticos incluem charantin, vicine, polipeptídeo-p, alcaloides e outras substâncias bioativas não específicas, como antioxidantes.

Os glicosídeos do ácido oleanólico, presentes no melão amargo, melhoram a tolerância à glicose em diabéticos do tipo II, ao impedir que o açúcar seja absorvido pelos intestinos. A fração de saponina extraída do melão amargo mostrou atividade hipoglicêmica em camundongos hiperglicêmicos induzidos por aloxana. Pode ser usado como um suplemento alimentar à base de ervas para o controle da diabetes e/ou de síndromes metabólicas.

Os efeitos adversos do melão amargo relatados em pesquisas incluem coma hipoglicêmico, convulsões em crianças, redução da fertilidade, síndrome do tipo favismo e dores de cabeça.

Coptis chinensis (Huanglian) – é comumente usada na China para tratar diabetes. A berberina, ingrediente ativo da Coptis chinensis encontrado em raízes, rizomas, caules e cascas de plantas, é um alcaloide isoquinolina.

A berberina pode também aliviar algumas complicações resultantes da diabetes. Estudos mostraram que ela restaurou os tecidos danificados do pâncreas, além de propiciar melhora da disfunção renal por meio do controle da glicose no sangue, redução do estresse oxidativo e supressão da via do poliol. A berberina melhora a lesão renal no diabetes induzido por STZ, não por supressão tanto no estresse oxidativo quanto nas atividades da aldose redutase.

Como a berberina é um agente oral, seu efeito hipoglicemiante foi semelhante ao da metformina em adultos com diagnóstico recente de diabetes do tipo II. Ela reduz ainda a glicemia de jejum e a glicemia pós-prandial em adultos com diabetes do tipo II mal controlada durante um período de três meses. A insulina plasmática em jejum, o índice de insensibilidade à insulina, o colesterol total e o colesterol de lipoproteína de baixa densidade também podem ser reduzidos significativamente com o uso de berberina.

Formulações de ervas chinesas para tratamento de diabetes

ADHF (formulação à base de ervas antidiabetes) – propicia redução no nível de glicose no sangue, assim como em outros parâmetros diabéticos, como insensibilidade à insulina. Alterações histopatológicas no pâncreas e no fígado também melhoraram significativamente em camundongos alimentados com ADHF.

Jiangtangkli – contém Radix Ginseng (Renshen), melhorando a insensibilidade à insulina, ao modular a composição da fibra muscular e TNF-α nos músculos esqueléticos.

YGD (yerbe mate – guaraná – damiana) – contém yerbe mate (folhas de Ilex paraguayenis), guaraná (sementes de Paullinia cupana) e damiana (folhas de Turnera diffusa). A cápsula de YGD atrasa o esvaziamento gástrico significativamente, aumenta o tempo para a sensação de plenitude gástrica e reduz o peso corporal expressivamente.

BN (Byakko-ka-ninjin-to) – contém Radix Ginseng (Renshen), Rhizoma Anemarrhena (Zhimu), Radix Glycyrrhizae Uralensis (Gancao), gesso (Shigao) e arroz. Reduz os níveis de glicose no sangue, da mesma forma que o ginseng-anemarrhena (ou ginseng-alcaçuz).

Mecanismos de ação das ervas no tratamento de diabetes 

O principal objetivo do tratamento de diabetes é minimizar a elevação dos níveis de glicose no sangue, mas sem permitir que esses níveis se tornem anormalmente baixos. Os mecanismos de ação das ervas hipoglicêmicas são múltiplos, como mostra a Figura 1: aumento na secreção de insulina, aumento na captação de glicose pelos tecidos adiposo e muscular, inibição da absorção de glicose pelo intestino e inibição da produção de glicose pelos heptócitos.

Tratamento fitoterápico de diabetes
Figura 1 – Ervas hipoglicemiantes e seus mecanismos de ação

É por meio desses mecanismos que se pode medir sua eficácia: aumento da secreção de insulina (ginseng, melão amargo, aloe, biophytum sensitivum), aumento na captação de glicose pelos tecidos adiposo e muscular (ginseng, melão amargo e canela), inibição da absorção de glicose pelo intestino (myrcia e sanzhi) e inibição da produção de glicose pelos heptócitos (berberina, folhas de feno-grego). A tabela abaixo mostra algumas ervas comumente usadas para o controle de diabetes mellitus e seus mecanismos de ação.

Tabela 1 – Ervas e seus usos no controle da diabetes

Diabetes - tratamento com ervas

Observações finais

Deve-se sempre estar atento ao prescrever ervas para o tratamento de diabetes, pois vários parâmetros ainda não estão claramente definidos em relação à questão medicamentosa ou suplementar de muitas delas, como padronização, caracterização, preparação, eficácia e toxicidade.

A interação erva-droga e erva-erva também precisa ser bem avaliada. Vários suplementos são conhecidos por terem efeitos intrínsecos na glicose sérica, como o ginseng. A gliclazida é um hipoglicemiante oral (antidiabético) classificado como sulfonilureia. O hipericão aumenta significativamente a depuração aparente da gliclazida. Portanto, pacientes que recebem esses medicamentos ao mesmo tempo devem ser monitorados para possível redução de eficácia.


Mari Uyeda – Mestre em Ciências da Saúde, nutricionista e professora do Departamento de Ciências da Saúde da Pós-graduação da Universidade Nove de Julho.