PICS nas empresas: benefícios proporcionados pelas práticas integrativas nas organizações

As práticas integrativas e complementares em saúde (PICS) fazem parte da vida de uma parcela da população brasileira, seja na rede pública (ainda de maneira restrita) ou na rede privada.

Tamanha é sua importância, que existe a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC).

Entretanto, é necessário que os benefícios oriundos dessas práticas alcancem uma parcela cada vez maior da população.

Estamos em uma era de transformações, em que os conceitos de saúde são renovados. De acordo com declaração da Organização Mundial de Saúde (OMS), “saúde não é somente a ausência de doenças e sim o completo bem-estar físico, mental e social” (1948). Ou seja, a própria OMS reconhece a relevância das PICS numa abordagem de saúde integral.

Em muitos casos, apesar de sua natureza complementar e integrativa em relação aos atendimentos convencionais de saúde, as PICS não se restringem somente a esse caráter, promovendo uma diminuição nos custos, no uso de medicamentos e na aplicação de alguns procedimentos, atuando também de forma a conjugar técnicas e métodos reabilitatórios, indo além das intervenções clássicas e desempenhando uma ação preventiva e preditiva.

As práticas integrativas e complementares proporcionam otimização dos tratamentos e aumento significativo da saúde e do bem-estar, melhorando a qualidade de vida individual e coletivamente.

Não se limitam a atuar somente na esfera física, abrangendo também os níveis mental, psicológico, energético e até mesmo espiritual.

Muitos métodos aplicados em saúde integrativa são milenares e transpassam gerações, tendo como base a sabedoria de ancestrais que, na época, só conheciam os procedimentos mais naturais, ou seja, aqueles mais ligados à natureza.

Entretanto, as PICS também acompanham a evolução oriunda de novos conhecimentos e descobertas em saúde, com o desenvolvimento mais recente de outras abordagens e metodologias terapêuticas, que são igualmente importantes.

PICS no ambiente de trabalho

Quando abordamos o tema do bem-estar, não podemos ignorar que passamos pelo menos um terço de nossas vidas trabalhando e que, portanto, o trabalho impacta diretamente em nossa saúde e na saúde das próprias organizações.

Saúde no trabalho não se restringe a somente cumprir normativas, mas sim envolve devolver à sociedade todo o benefício para otimização desse bem-estar.

Há organizações que vão além e até criam diretorias específicas para esse fim, como por exemplo uma grande indústria cervejeira que implementou a diretoria da ciência da felicidade, pois afinal a felicidade é complexa e é o desejo de toda a pessoa.

Já ultrapassamos a era em que achávamos que fisioterapia do trabalho era só a prática de ginástica laboral e que qualidade de vida nas empresas resumia-se em quick massage e auriculoterapia.

Nesse universo, temos os mais variados métodos e recursos disponíveis, cada um com sua especificidade.

Alguns deles destinam-se a aumentar a performace da mente, reduzindo a sobrecarga mental e consequentemente o retrabalho, aumentando os níveis de atenção e diminuindo os riscos de acidentes.

Nas abordagens tradicionais da yoga e da medicina tradicional chinesa há métodos capazes de proporcionar diminuição de dores e de tensão, como shiatsu e massagem tuiná.

A ozonioterapia pode ser utilizada de forma rápida para, por exemplo, casos de sinusite e rinite, que não são raros em ambientes refrigerados e frigoríficos.

A meditação/mindfulness é capaz de otimizar a saúde e o bem-estar através do autoconhecimento, limpeza da mente e normalização do sistema nervoso autônomo.

Meditação/mindfulness

A palavra meditação, em sua origem, significa “encontrar uma cura”. Há diversas correntes de prática meditativa, mas o objetivo maior é sempre o de atingir a serenidade, contribuindo para o autoconhecimento e crescimento pessoal.

Ela também pode ajudar no alívio de dores e melhoria do sistema imunológico.

Já mindfulness, que é uma das modalidades de meditação, significa atenção plena no presente momento, tendo portanto como objetivo final desenvolver o foco e a concentração.

É um termo moderno para designar um dos aspectos da prática milenar de autorrealização, que é uma meta essencial de toda pessoa.

O mindfulness trouxe uma nova roupagem para a realidade corporativa, contemplando a concentração e o foco necessários para longas jornadas de trabalho e mesclando a harmonia das equipes e a saúde dos colaboradores.

É uma prática a ser adotada por empresas modernas que se preocupam com o bem-estar de seus colaboradores e compreendem que, oferecendo uma melhor qualidade de vida organizacional, podem obter maiores resultados de produtividade.

Há um estudo nos Estados Unidos que mostra que, para cada um dólar (US$ 1) investido no bem-estar dos funcionários, há um retorno de seis dólares e quinze centavos (US$ 6.15).

A norte-americana Google Inc. foi uma das pioneiras a buscar a prática de meditação durante o expediente de trabalho, desde 2007. E foi ainda além, oferecendo consultoria sobre mindfulness para diferentes empresas mundo afora.

Outra gigante da tecnologia a se destacar nesse sentido foi a Apple Inc., utilizando terapias alternativas para garantir o bem-estar de seus funcionários, que desfrutam de 30 minutos diários para praticar meditação durante a jornada de trabalho.

A Samsung é também mais um exemplo de corporações que investem em práticas meditativas.

Para as equipes de trabalho, o exercício de meditação revela-se como uma das válvulas do espírito engajado, promovendo um maior nível de resiliência, criatividade e foco.

O mindfulness é a prática preferida entre executivos para melhorar o foco, diminuir a ansiedade, turbinar a inteligência emocional, reduzir o sentimento de impotência e consequentemente melhorar a tomada de decisões.

A implementação de mindfulness em empresas (programa MBSR – mindfulness based stress reduction – redução do estresse baseada em mindfulness), que pode ser feita com pausas a partir de três minutos, traz os seguintes benefícios: aumento de produtividade, da habilidade de concentração, da criatividade para soluções de problemas, do desempenho cerebral e da capacidade de discernimento; manutenção de uma mente mais calma frente a situações de estresse, redução da ansiedade, da dispersão e da preocupação, com consequente aumento do equilíbrio físico e emocional; melhora do clima organizacional, aumento da sensação de bem-estar, da qualidade de vida e da motivação; formação de um ambiente de trabalho mais agradável, melhora do relacionamento interpessoal e do engajamento, aperfeiçoamento na gestão de conflitos, podendo ser utilizado como solução ou parte da solução quando há a identificação de riscos nas avaliações de ergonomia relacionadas aos fatores organizacionais, psicossociais e cognitivos; potencialização e otimização do trabalho, melhora da relação entre chefias e subordinados e redução do presenteísmo.

Medicina ayurvédica, naturopatia e homeopatia

Outra prática integrativa e complementar cujas bases podem ser inseridas no sistema de gestão da saúde e qualidade de vida no trabalho é a medicina ayurvédica.

O ayurveda, que teve origem na Índia há mais de 4.000 anos, é reconhecido pelo Ministério da Saúde como parte da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares, assim como a maioria dos outros métodos mencionados neste artigo.

Essa abordagem milenar preconiza a adoção de hábitos saudáveis na vida diária, de forma a manter o organismo livre de toxinas, o sistema imunológico fortalecido e a mente liberada de traumas e problemas.

Seguindo o mesmo princípio de olhar para a saúde do indivíduo de forma total, a partir da mudança no estilo de vida, a naturopatia baseia-se na utilização de vários recursos da natureza, para promover a prevenção e tratamento de condições como diabetes do tipo dois, cardiopatia, doenças crônicas, transtornos mentais, etc.

A homeopatia e a microfisioterapia são mais dois exemplos de abordagens terapêuticas que, assim como a naturopatia, o ayurveda e as demais modalidades de medicinais tradicionais, comungam do mesmo princípio: o reconhecimento da capacidade inata do organismo humano de curar-se e autorregular-se.

O uso de substâncias naturais em suas várias formas de aplicação traz também o benefício de desencadear menos efeitos colaterais e interações medicamentosas do que as medicações alopáticas.

Yoga

A yoga, prática também milenar, foi introduzida no Ocidente aproximadamente nas décadas finais do século XIX. Apresenta algumas correntes, mas de forma genérica baseia-se em respirações, relaxamento, exercícios e posturas estáticas (que favorecem a musculatura estática necessária para muitas atividades) e contemplação.

Dentre seus benefícios, podem-se citar os seguintes: favorecimento das áreas de crescimento cerebral, rejuvenescimento do cérebro, ativação do sistema nervoso parassimpático, aumento dos níveis de GABA, que é um neurotransmissor que relaxa as células cinzentas do cérebro, liberação de neurotransmissores (assim como qualquer outra atividade física) – como endorfina, que atua como analgésico natural e serotonina, que promove bem-estar e relaxamento –, circulação adequada de energia no corpo, melhora da concentração e da memória, diminuição dos níveis de estresse e cansaço, melhoria na capacidade de enfrentar problemas, aumento da autoestima, melhoria e maior sinergia nos padrões de ondas cerebrais – proporcionando em consequência aumento da criatividade, maior rapidez de aprendizado, otimização do controle das emoções e melhor desempenho do cérebro –, maior estimulação das ondas alfa, promovendo um estado de quietude.

Estudos demonstram ainda que fatores de risco para o surgimento de doenças cardiovasculares diminuíram em praticantes de yoga em comparação com pessoas que não praticam nenhuma atividade física.

PICS em grupo: biodança, dança circular e tai chi chuan

Na esfera das atividades coletivas, há terapias como a biodança, a dança circular e o tai chi chuan, que promovem um incremento nas relações intra e interpessoais, promovendo maior motivação, descontração, sentimento de pertencimento e valorização.

O tai chi chuan, também conhecido como meditação em movimento, é praticado em silêncio e com movimentos lentos.

A prática regular do tai chi chuam traz os seguintes benefícios para a saúde: aumento da vitalidade, com mais disposição e energia para o dia a dia, aumento da concentração, melhora do equilíbrio mental, alívio do estresse e da ansiedade, combate à depressão, harmonização das emoções, estimulação do convívio social, melhora do sistema imunológico e do sistema nervoso, diminuição da tensão muscular, estimulação da consciência postural, correção da postura, fortalecimento dos ossos e dos músculos, aumento da flexibilidade das articulações e melhora do equilíbrio, com diminuição dos riscos de queda e fraturas, sendo portanto indicado também para pessoas que executam trabalhos em altura e atividades que exijam equilíbrio.

Assim como o tai chi chuan, o lian gong é outra prática que integra a medicina tradicional chinesa, embora tenha sido desenvolvido nos tempos atuais.

É mais uma das atividades integrativas que podem ser realizadas em grupo, proporcionando benefícios como diminuição de dores, inclusive crônicas, maior equilíbrio, melhora na qualidade do sono e aumento da vitalidade, com consequente melhoria na qualidade de vida e bem-estar.

O lian gong é também indicado em casos de hipertensão arterial sistêmica (HAS), depressão e diabetes mellitus.

Essas práticas integrativas corporais e realizadas em grupo melhoram a conexão do ser humano consigo mesmo, com outras pessoas, com o universo e com o tempo presente.

Elas propiciam a formação e fortalecimento de vínculos e solidariedade e a melhoria da autoestima, autoconfiança e autocontrole entre os participantes, contribuindo para que os sujeitos apropriem-se de sua saúde.

Barras de access, imaginação guiada e musicoterapia

As barras de access constituem uma técnica terapêutica em que se estimulam trinta e dois pontos na cabeça, sendo recomendada para combinação e/ou ativação das ondas cerebrais, recondicionando a mente e promovendo benefícios como ganho de autoconfiança, maior bem-estar e bom humor e maior clareza nos pensamentos, podendo portanto ser um recurso valioso para fomentar as tomadas de decisão.

Já a técnica de imaginação guiada, que se baseia na interação mente-corpo, proporciona relaxamento e é capaz de potencializar um determinado objetivo ou atividade.

A música também exerce um papel essencial na vida das pessoas, sendo capaz de definir o humor, emocionar, etc.

Tanto as músicas quanto os mantras trabalham com a vibração do ar. O pensamento também emite vibrações. Sendo assim, quando conectados, eles entram em sintonia.

Esse conceito pode ser aplicado com eficácia em técnicas de musicoterapia ou, no caso dos mantras, como parte das práticas de yoga e meditação.

A tríade do mundo moderno: estresse, ansiedade e depressão

Sabemos que o estresse, a ansiedade e a depressão, assim como a síndrome de burnout vêm crescendo de forma exponencial nas organizações, afetando os gastos com saúde e produtividade.

As ferramentas terapêuticas podem ser benéficas para todas as pessoas que atravessam períodos de distúrbios emocionais. Porém, em locais onde a demanda por trabalho intelectual é maior, é possível usá-las com mais frequência.

No mundo globalizado, os números relativos à saúde mental são alarmantes. Estima-se que os custos anuais dos problemas de saúde mental equivalem a US$ 1 trilhão e projeta-se que chegarão a US$ 6 trilhões até 2030.

De acordo com levantamento feito pelo escritório de advocaciaTrench Rossi Watanabe, no Brasil as reclamações trabalhistas relacionadas à síndrome de burnout somaram R$ 2,48 bilhões de gastos para as empresas, entre 2014 e 2022, o que representa uma média de R$ 306 mil por processo. Os números aumentam ainda mais quando também são considerados os afastamentos por ansiedade e depressão.

Uma outra pesquisa, realizada em 2015 (antes da pandemia de Covid-19), revelou que problemas relacionados à saúde mental levaram a aproximadamente R$ 17,6 milhões de dias de licença-médica.

Projeções futuras dizem que 50% dos adultos tendem a sofrer de doença mental em algum momento de sua vida. Dentro de uma empresa, isso pode significar metade dos recursos humanos.

Em evento realizado pelo Banco Mundial junto à OMS, evidenciou-se a grande preocupação com essa verdadeira epidemia de distúrbios mentais. O evento recebeu a seguinte nomenclatura: “Fora das sombras: tornando a saúde mental uma prioridade global para o desenvolvimento”.

Segundo dados da OMS, o Brasil figura como o país da América Latina com o maior índice de casos de depressão.

Já de acordo com a unidade brasileira da International Stress Management Association (ISMA), mais de 30% dos profissionais no Brasil sofrem com a síndrome de burnout.

Quando o estresse deixe de ser um processo natural de reação do organismo e  passa a ser negativo, tornando-se o que é chamado de distresse, ele começa a causar sofrimento.

Nesse caso, leva o indivíduo ou a comunidade ao esgotamento, o que indica que a situação vivenciada apresenta um nível de exigência que é maior do que os meios disponíveis para enfrentá-la.

O estresse negativo pode ser agudo, agudo episódico ou crônico, desencadeando então a síndrome de burnout (síndrome de esgotamento profissional, físico e mental).

Dentre as suas possíveis causas, podem ser citadas as seguintes: falta de autonomia no trabalho, alterações frequentes nos turnos de trabalho, pressão das chefias, pressão por resultados, conflitos hierárquicos e entre colegas, descanso insuficiente, jornadas extenuantes, desconforto térmico e/ou acústico, medo de demissão, dificuldades financeiras e a pior de todas – o assédio moral e/ou sexual.

O estresse pode provocar alguns ou vários dos seguintes sintomas: irritabilidade, agressividade, ansiedade, desânimo, angústia, tristeza, falta de concentração, insônia, dor de cabeça, tonturas, problemas digestivos, queda de cabelo, baixa imunidade, problemas respiratórios, halitose, problemas de pele, dores crônicas, alterações na libido e no apetite e tensão muscular, entre outros.

A vida laboral pode contribuir para o desenvolvimento ou ser a principal causadora dos distúrbios mentais e emocionais.

E as práticas integrativas, que têm como conceito básico a abordagem do ser humano em sua totalidade, englobando os aspectos físicos, mentais, emocionais e espirituais, podem ser de grande valia no gerenciamento da saúde mental nas empresas.

Para isso, é fundamental disseminar informações sobre o que são as PICS e como eles atuam, pois sabemos que só transformamos aquilo sobre o qual tomamos consciência.

Comentários finais

As PICS não somente são aliadas no gerenciamento da saúde e qualidade de vida no trabalho, como propiciam um retorno positivo para as empresas e seus colaboradores, além de promover uma redução dos custos com a saúde a níveis bem mais baixos.

Obviamente, esse assunto é tão vasto que não pode ser abrangido em um único artigo.

Algumas práticas foram aqui citadas e outras não. Algumas já fazem parte de listagens oficiais, como as do Ministério da Saúde no Brasil ou da OMS, enquanto outras ainda não estão inseridas nesses descrições, mesmo porque cada vez mais são criadas e desenvolvidas novas modalidades terapêuticas. Porém, todas têm por objetivo a promoção da saúde sob um enfoque integral.

Essas práticas também se apresentam como soluções para resolver problemas sem ou com opções insatisfatórias no ambiente corporativo, vindo a mitigar os custos humanos do trabalho.

A nova Norma Regulamentadora nº 1 – NR-1 veio ratificar a obrigatoriedade da contemplação dos riscos ergonômicos, incluindo os psicossociais e cognitivos e seus respectivos Programas de Gerenciamento de Riscos (PGR).

Cada técnica ou um conjunto de técnicas pode ser utilizado por todos os tipos de empresas e não somente pelas grandes corporações. Mas é preciso que seja feito um diagnóstico da organização por um profissional da área, para que se possa saber ao certo e recomendar o que será mais apropriado para aquela empresa específica, de acordo com a sua dor (demanda). Todas as coisas agregam valor às nossas vidas.


Dra. Elisabete Rodrigues Frazão – Fisioterapeuta, com pós-graduação em Fisioterapia do Trabalho e Ergonomia e em Fisioterapia Forense. Consultora em Ergonomia e especialista em Microfisioterapia, RPG (Reeducação Postural Global), LPF (Low Pressure Fitness) e Massoterapia. Possui MBA em Gestão de Negócios Sustentáveis (com ênfase em Meio Ambiente, Saúde e Segurança do Trabalho e Responsabilidade Social). Criadora e fundadora da Befra Consultoria – soluções para o trabalho.