Constelação familiar: atributos fenomenológicos para o autoconhecimento e melhoria das relações

Constelação familiar é uma abordagem terapêutica fenomenológica complementar ao trabalho de autoconhecimento e de melhoria nas relações. Ela não substitui terapia e nem prescrições médicas, tão pouco são todas as pessoas que se encontram preparadas emocionalmente, e muitas vezes até cognitivamente, para a sua aplicação.

As constelações familiares foram desenvolvidas pelo psicoterapeuta alemão Bert Hellinger, na década de 1990, como fruto de seus estudos e da combinação de terapia sistêmica e familiar, terapia primal, psicanálise, práticas grupais das tribos zulus e pensamento filosófico fenomenológico.

Hellinger, através da aplicação e empirismo dessa abordagem, realizada com milhares de pessoas em diversos países, intenciona que parte dos nossos problemas tem raízes em questões não resolvidas no íntimo familiar de origem, podendo ser repetidas ao longo de gerações.

Durante o atendimento efetuado com o uso dessa metodologia, um facilitador em constelação familiar auxilia seu constelado, que aqui vou chamar de interagente, a escolher pessoas ou bonecos para representarem membros de sua família ou outras pessoas relevantes para sua questão ou tema.

Bonecos ou pessoas são configurados espacialmente no local indicado, a partir da intuição do interagente. A disposição espacial dos representantes e as interações que se desenvolvem durante o atendimento vão fornecer insights sobre os emaranhamentos ocultos e dinâmicas de padrões repetitivos familiares, com o objetivo de orientar o interagente para possíveis soluções após o atendimento.

Particularmente, não acredito, pela minha experiência, que a constelação promova em si a resolução de tais conflitos ou crie mecanismos sobrenaturais para saná-los. Mas, infelizmente, muitos facilitadores a ofertam sob essa condição. O que faz grande diferença e traz mecanismos de possíveis mudanças é a postura do interagente, a partir do que lhe foi revelado.

O atendimento é único e pontual. Em uma única facilitação, é possível revelar emaranhamentos ocultos e/ou dinâmicas de padrões repetitivos. Principalmente no que tange à autorresponsabilização do interagente para desenvolver e ressignificar sua relação de conflito.

É recomendado (tenho procedido assim), embora não seja uma regra, que paralelamente ao atendimento em constelação familiar já se faça um acompanhamento psicológico, junto a um profissional qualificado que possa contribuir para a elaboração do que foi revelado na constelação.

Fenomenologia: controvérsias e possíveis contribuições

Embora tenham ganhado popularidade, as constelações familiares têm sido alvo de debates e críticas dentro da comunidade terapêutica, levantando preocupações sobre a sua eficácia e sua base científica, principalmente no que se refere ao uso da fenomenologia, por trazerem à tona o que está inconsciente. E também pelo fato das pessoas que agem como representantes apresentarem falas e atitudes que, por vezes, são muito próximas de quem está sendo representado, mesmo sem conhecê-lo previamente.

Muitos são os questionamentos sobre essa metodologia: constelação é espiritismo? As pessoas incorporam espíritos? As pessoas entram em transe coletivo? Os facilitadores usam hipnose? Fazem algum uso de substância? A constelação foi criada nos laboratórios nazistas? Esses são alguns questionamentos que eu mesma já ouvi, ao longo de cinco anos dedicados aos atendimentos com a utilização dessa abordagem terapêutica.

A fenomenologia é um método filosófico. De forma bem simplista, com o objetivo de facilitar o entendimento, pode-se dizer que fenômeno é aquilo que se apresenta, aquilo que se mostra e é observável, a ponto de se extrair dele um conhecimento.

O fenômeno em si independe de uma teoria ou fundamentação a priori que o explique. Ele se expressa e vai se manifestando conforme o que vai sendo revelado, no aqui e agora, através da movimentação intuitiva das pessoas ou da disposição espacial, no caso dos bonecos. Mas é necessário o trabalho de um facilitador experiente para auxiliar em todo o processo de investigação sistêmica.

Sobre isso, Bert Hellinger expõe: para mim a fenomenologia significa: eu me exponho a um contexto mais amplo sem compreendê-lo. Eu me exponho a esse contexto sem a intenção de ajudar e também sem a intenção de provar algo. Eu me exponho a ele sem medo do que poderá vir à luz. Eu me exponho a tudo, assim como se apresenta” (Hellinger, Bert. pág. 30, 2007).

Assim, destaco, a seguir, como a abordagem fenomenológica pode nos auxiliar no processo de autoconhecimento e na melhoria das relações.

Apresentação das dinâmicas familiares ocultas: muitas vezes criamos uma autoimagem distorcida sobre nós mesmos e/ou projetamos nossas expectativas nos outros. A fenomenologia quebra com esses rótulos, trazendo dinâmicas ocultas da personalidade, por vezes duras de serem vistas, e que podem ter relação com um padrão de comportamento repetitivo familiar.

Exploração das dinâmicas sistêmicas familiares: por vezes, muitos comportamentos estão arraigados e são originários de tempos familiares muito antigos. A fenomenologia descortina padrões repetitivos que muitas vezes não podem ser explicados pelas relações atuais do sistema familiar.

Padrões ocultos e emaranhamentos: existe uma ressonância sistêmica entre os membros de uma família, que inclui sentimentos, conflitos e dores, mesmo que não haja um vínculo direto com um integrante da família. A fenomenologia mostra-se como uma compreensão dessas conexões, não apenas como um exercício teórico, mas como uma investigação clara e objetiva para questões que se apresentam no cenário familiar de agora.

Resoluções e autorresponsabilização: a fenomenologia nos tira de nossa zona de conforto e idealizações. Assim, é possível visualizar novas maneiras de interação familiar, através do encorajamento dado ao interagente/cliente na mudança de posturas mais saudáveis para a promoção da autonomia individual e coletiva.

Capacitação no uso da fenomenologia: por meio dos insigts revelados, pode-se conduzir o interagente/cliente no apoio à sua autonomia e autorresponsabilização nas relações, sendo essencial que um facilitador experiente guie esse processo, com conhecimento, estudo, ética e profissionalismo.

Como a fenomenologia acontece: uma visão dentro do paradigma consciencial

 A ciência materialista convencional delimita algumas abordagens da realidade, mensuráveis e observáveis através de sofisticados aparelhos. Perde, em contrapartida, muitos outros aspectos da mesma realidade pelo fato de rejeitar a utilização do indivíduo/consciência no estudo de si mesmo e das influẽncias e reflexos da realidade extrafísica.

Esse limite do paradigma materialista, que entende a manifestação do indivíduo/consciência apenas dentro de uma abordagem física, como resultado da contraposição sujeito-objeto, tem sido apontado, estudado, discutido e experienciado pela neociência chamada conscienciologia, que é a ciência que estuda a consciência e sua manifestação de forma integral.

A conscienciologia pauta-se pelo paradigma consciencial, no qual o pesquisador não é o observador ausente, mas assume o papel de laboratório e cobaia de si mesmo. Ou seja, colocando-se como protagonista e pesquisador de sua própria fenomenologia e das influências da realidade física e extrafísica.

A conscienciologia foi proposta pelo médico e pesquisador brasileiro Waldo Vieira, em 1986, com a publicação do tratado Projeciologia: Panorama das Experiências da Consciência Fora do Corpo Humano. Depois da divulgação desse compêndio, publicou outros tratados. Sua bibliografia e seus estudos são vastos e abordam a realidade da multiexistencialidade, multidimensionalidade, policarmalidade, bioenergética, cosmoética, holossomática e interassistencialidade.

Vamos nos ater aqui a três dessas realidades: da bioenergética, em que tudo que se manifesta é energia. Da holossomática, que é o conjunto de corpos ou veículos de manifestação da consciência. E por último da multidimensionalidade, que mostra que nós nos relacionamos e trocamos informações não somente na condição física, mas também através dos nossos corpos sutis. Intercambiamos trocas e informações também nas relações em nível extrafísico. Essa realidade interfere diretamente na percepção de quem nós somos e dos ambientes em que estamos inseridos. Estamos há milênios condicionados a não acreditar nessa realidade, em razão de pré-conceitos, ignorância, misticismos e charlatanismos.

Holossoma: é constituído pelos veículos de manifestação da consciência ou conjunto de corpos (Figura 1).

Cada indivíduo/consciência, em sua manifestação existencial, faz uso dos quatro corpos ilustrados abaixo, da esquerda para a direita: SOMA (corpo físico), ENERGOSSOMA (corpo energético), PSICOSSOMA (corpo das emoções) e MENTALSOMA (corpo da racionalidade, sede da nossa inteligência).

Fenomenologia e conscienciologia - holossoma
Fig. 1 – Representação do holossoma. Fonte: https://www.reaprendentia.org/curso-intermissivo/.

É através do corpo de energia que o soma promove as trocas com os corpos sutis – psicossoma e mentalsoma. Consequentemente, é por meio dele também que se efetua a troca com as realidades extrafísicas ou multidimensionais.

Para o paradigma consciencial tudo é energia, sendo que existem duas: a imanente e a consciencial.

Imanente é a energia primária, vibratória, essencial, multiforme, impessoal, difusa e dispersa em todos os objetos ou realidades do Universo, de modo onipresente.

Consciencial é a energia imanente utilizada por um indivíduo/consciência em suas manifestações. É a condição em que nos encontramos e que é modificada pelos nossos pensamentos, sentimentos e energias (com base nisso, criou-se o trinômio chamado pensenes). Ou seja, a qualidade do que pensamos, sentimos e emitimos energeticamente modifica os ambientes e as pessoas à nossa volta. Nossa manifestação individual/consciencial e nossas relações são um processo energético total.

Ainda que não tenhamos consciência sobre essa realidade, pelo menos não de forma racional e observável, criamos, por meio dos pensenes, campos energéticos ou magnéticos, que carregam uma carga informacional sobre nós mesmos.

Fazemos essa leitura, uns dos outros, através da nossa aura, que é um halo luminoso, dinâmico e multicolorido que reflete as nossas energias ou nosso mundo íntimo (pensamentos, sentimentos e energias – pensenes). A aura é a manifestação mais densificada do energossoma (corpo das energias).

Campo energético: é formado pelo conjunto de pensenes ou holopensenes. Como foi visto até aqui, um indivíduo/consciência está a todo momento, em sua manifestação, emitindo pensenes, que são a junção de pensamento, sentimentos e energia. Eles são indissociáveis e possuem uma carga informacional sobre nós mesmos. Estamos o tempo todo captando e trocando os pensenes com outros indivíduos/consciências. E em grande maioria das vezes, isso é feito de forma intuitiva. Poucas são as pessoas que têm consciência e se dedicam a estudar e identificar essa realidade e seus próprios pensenes.

Cada pessoa ou ambiente possui uma matriz pensênica ou campo energético pessoal. Isso é o que faz, por exemplo, com que falemos frases como: “eu não fui com a cara de fulano”, “a energia de beltrano é muito negativa”, “estar ao lado de sicrano me causa bem-estar, “nossa, aquele ambiente estava muito carregado”.

Estamos todo o tempo realizando essa troca e ela é tão corriqueira em nós, que dizemos coisas assim, ainda que não entendendo a complexidade que há por trás disso em relação às energias e suas manifestações em nós.

Nos workshops de constelação familiar forma-se um campo holopensênico, ou seja, um campo de magnetismo coletivo, que seria o conjunto de pensamentos, sentimentos e energias mútuos, de todas as pessoas ali envolvidas e também de seus familiares não presentes, porque a energia é fluida, volátil e variável. Ao sairmos por aí, carregamos em nós o campo holopensênico de nossa casa, de nosso trabalho e de nossos grupos.

Assim, em um workshop de constelação, a fenomenologia é o resultado da leitura e representação do holopensene pessoal e dos familiares do interagente. O que podemos observar nos campos energéticos formados na constelação familiar é que temos pessoas mais sensíveis para realizar uma leitura energética informacional de outra pessoa e manifestá-la. É por isso que alguém que nunca viu a mãe de um interagente pode representá-la com tanta fidelidade.

Consciência e seus atributos na manifestação do fenômeno: podemos ainda fomentar que a consciência possui três atributos importantes para sua manifestação fenomenológica. Eles contribuem e podem ser observados no campo de constelação familiar para explicar como o campo energético e a representação acontecem.

1 – Vontade: as pessoas ali imputadas pelas suas vontades encontram-se para vivenciar o campo energético, a partir das representações com pessoas ou bonecos e dos insights oriundos dessa representatividade. A vontade de todos os envolvidos cria um holopensene propício para a manifestação do fenômeno.

2 – Intenção: através da intenção do representante de se entregar à fenomenologia da representação que foi convidado a manifestar, realiza-se o acoplamento energético, que é a interfusão ou união temporária das auras de duas ou mais consciências, quando geralmente ocorrem trocas energéticas e informacionais.

Para isso, elas não precisam estar no mesmo ambiente, pois como devemos lembrar as energias são fluidas e voláteis. Reforçando: esse fenômeno acontece a todo momento em nosso cotidiano, só que grande parte das pessoas não está lúcida para essa ocorrência, pelo menos não de forma racional. Você mesmo já pode ter vivenciado a experiência de evocar a lembrança de uma pessoa e em seguida ela lhe ligar ou então de encontrá-la depois na rua.

No caso da constelação, o que acontece através da representatividade de pessoas ou bonecos é o acoplamento energético provocado, quando o indivíduo, desencadeado pela sua vontade e evocando uma outra consciência mesmo sem conhecê-la, promove o acoplamento energético de forma intencional, por intermédio da sua evocação. O significado de evocação aqui é o de um chamamento, de trazer à lembrança algo ou alguém.

3 – Auto-organização: a partir da observação da fenomenologia, do que é trazido à tona, o interagente/cliente é encorajado a efetuar mudanças em seu cotidiano para resoluções dos conflitos familiares, por meio de novas posturas e condutas auto-organizadoras, de forma a promover a sua saúde relacional. É a sua disposição a mudanças que vai auxiliá-lo na superação de seus conflitos relacionais.

Considerações finais

O objetivo deste artigo é desmistificar, tirar os aspectos de religiosidade ou de charlatanismo por detrás da constelação familiar.

Para que uma prática seja considerada científica, são necessários os critérios de observação, experimentação (laboratórios empíricos), análise e publicação.

Tanto nas constelações familiares quanto na conscienciologia, esses requisitos foram realizados por Bert Hellinger e Waldo Vieira e continuam sendo explorados cotidianamente pelos seus colaboradores, através de estudos, cursos de formação e publicações.

Assim, não se pode dizer que as práticas científicas não estão sendo aplicadas nessas duas metodologias.

Para a ciência vigente, a condição sine qua non é a abordagem cartesiana e materialista. Com isso, qualquer prática para além da realidade física será considerada fraude, pseudociência, misticismo, charlatanismo, etc.

Sou favorável que cada vez mais levemos a sério as abordagens metafísicas realizadas por pessoas competentes e engajadas em seus estudos, independentemente dos dogmas.

Não me compete criar celeumas ou impor verdades para os materialistas, mas trazer um estudo e uma abordagem mais cientificista, como frutos da minha pesquisa pessoal, através dos quase cinco anos de atendimento usando essa metodologia fenomenológica para proporcionar resultados positivos para meus interagentes. E dos meus estudos individuais e grupais por meio de laboratórios de práticas energéticas e de observações de campo das manifestações dos corpos sutis e da intercambialidade entre os planos físicos e extrafísicos por meio da conscienciologia.

Acredito que as abordagens fenomenológicas, como é o caso da constelação familiar, podem se associar a outras práticas, como a psicologia, a psicanálise, a medicina e a nutrição, como formas de aprimoramento da nossa saúde mental. Uma vez que, a partir da abordagem consciencial, ter saúde é agregar a realidade e manifestação de todos os nossos corpos.

Finalizo dizendo que temos na conscienciologia o princípio da descrença: “não acredite em nada do que está escrito aqui, em nenhuma palavra. Tenha você suas próprias experiências e investigações”.

Reforço que crenças limitam, enquanto experiências libertam.


Paola Mateus Moreira – Terapeuta e criadora da ferramenta “Investigação Sistêmica e Consciencial”, cujo objetivo é investigar os movimentos ocultos e padrões inconscientes, visando à autorresponsabilização nas relações, a partir da abordagem de reconciliação grupocármica. Professora e voluntária da Equipe Consciência Ativa do curso Noções Básicas do Paradigma Consciencial e voluntária dos Colégios Invisíveis de Parasenguranciologia e Ginossomatologia da Conscienciologia.

 

Referências bibliográficas

HELLINGER, Bert. A simetria oculta do amor: por que o amor faz os relacionamentos darem certo. São Paulo: Cultrix, 2006.

HELLINGER, Bert. HOVEL, Gabriele Ten. Constelações Familiares: o reconhecimento das ordens do amor. São Paulo: Cultrix, 2007.

HELLINGER, Bert. Ordens do amor: um guia para o trabalho com constelações familiares. São Paulo: Cultrix, 2007.

VIEIRA, Waldo. Nossa Evolução – 3° edição – Foz do Iguaçu: Associação Internacional Editares, 2010.

VIEIRA, Waldo. Projeciologia: panorama das experiências da consciência fora do corpo humano – 10a Edição – Foz do Iguaçu: Associação Internacional Editares, 2008.

VIEIRA, Waldo. 700 Experimentos da Conscienciologia – 3° edição. Foz do Iguaçu: Associação Internacional Editares, 2013.