Uso de massagem em crianças com câncer

A massagem como recurso terapêutico é reconhecida pela eficácia no alívio de dores e melhora da consciência corporal e das tensões, bem como da nutrição dos tecidos pelo aumento da circulação sanguínea e linfática, trazendo benefícios tanto físicos quanto emocionais.

Define-se massagem como a utilização de toques rítmicos e metódicos e compressão dos músculos e tecidos conectivos, com o objetivo de aliviar o estresse, promover analgesia, diminuir edemas e melhorar a funcionalidade do organismo como um todo, além de proporcionar tranquilidade, diminuir a ansiedade e desenvolver consciência corporal e emocional.

A manipulação de tecidos superficiais acarreta mudanças nas funções de órgãos e glândulas, já que essas estruturas estão ligadas através dos dermátomos e miótomos definidos no desenvolvimento embrionário. A massagem estimula os receptores sensoriais da pele, os quais são responsáveis por transformar o estímulo em sinal biológico. As vias aferentes levam impulsos ao sistema nervoso, interrompendo o padrão de excitação existente nos centros de controle do sistema nervoso central (SNC) e mudando os impulsos motores, o que resulta em relaxamento pela liberação de neurotransmissores.

O sistema nervoso (SN) é o responsável pelas reações do organismo ao receber estímulos internos (provenientes dos órgãos) ou externos (do meio ambiente). Essas reações têm como propósito adaptar e reequilibrar o indivíduo ao meio ou à situação. Desse modo, o principal objetivo da massagem é levar o organismo de um estado simpático (estresse) para um estado mais parassimpático (relaxamento). Essa transição de estado físico e mental acarreta uma cascata de efeitos fisiológicos, que atuam na diminuição da dor, melhora do sistema imunológico e sensação de bem-estar, além de outros benefícios, como melhora da atenção e memória, diminuição de insônia, ansiedade e estresse e melhor funcionalidade dos órgãos em geral, já que o organismo entra em um estado de equilíbrio, sinônimo de saúde.

Efeitos do câncer em crianças

Câncer é o crescimento desordenado de células que sofreram alteração no DNA dos genes (mutação genética), por fatores externos (ambientais, hábitos particulares e meio social) ou internos (geralmente relacionados com a predisposição genética). Quando ocorre o desenvolvimento dessas células, o corpo reage através do sistema imunológico, da capacidade de reparação do DNA e da produção de enzimas responsáveis por transformar e eliminar substâncias cancerígenas introduzidas no organismo. Porém, nem sempre o corpo consegue restabelecer o desenvolvimento natural das células e então ocorre a carcinogênese.

O tratamento do câncer requer muita paciência e persistência. Os sistemas nervoso e psicológico das crianças acometidas ficam extremamente abalados, o que dificulta o tratamento. A criança com câncer pode sofrer de dores devido à localização do tumor, prisão de ventre e náuseas decorrentes da ação dos medicamentos utilizados para minimizar os sintomas e linfedema após passar por alguma cirurgia. Devem ser considerados também os efeitos psicológicos causados pela doença, como estresse, ansiedade e depressão.

Massagem como coadjuvante ao tratamento convencional

Ao contrário do que muitos pensam, a presença de câncer não é uma contraindicação para a aplicação de massagem. Portanto, essa é uma técnica que pode ser incorporada de forma segura ao tratamento convencional do câncer, com o objetivo de reduzir o estresse, a ansiedade e a dor, possibilitando uma maior tolerância e melhor resposta aos tratamentos atuais de cura.

De acordo com estudos, pacientes que receberam a terapia de massagem como coadjuvante ao tratamento convencional, por três vezes na semana, com sessões de 45 minutos, durante um período de 45 dias, apresentaram resultados animadores. Foi notada redução no uso de anti-inflamatórios, o que indica que as crianças sentiram menos dores, e diminuição da ansiedade e das náuseas.

Em outro estudo, realizado pelo Centro de Câncer Memorial Sloan-Kettering, em Nova York, onde 3.609 pacientes foram avaliados, houve melhora de 50% na intensidade dos sintomas após a realização de massagem.

A massagem também pode ser utilizada na cicatrização de feridas pós-operatórias e liberação de resíduos metabólicos, melhorando a circulação.

Na parte imunológica, foi detectado um aumento no número de linfócitos, os quais são responsáveis por destruir células tumorais, e nas atividades das células natural killers. Em crianças com leucemia, houve aumento na quantidade de neutrófilos. Esses dados estão relacionados com a ampliação da atividade parassimpática desencadeada pela massagem, o que leva a uma melhora na função imunológica do paciente.

A massagem apresenta ainda efeitos sobre o sistema circulatório, o que ajuda a melhorar o processo de cura e a função imunológica do paciente. A estimulação cutânea também favorece a produção de linfócitos T, células que atuam na proteção do organismo.

Massagem no controle da dor

A dor é uma experiência desagradável e subjetiva que envolve componentes sensoriais, afetivos, cognitivos, sociais e comportamentais, sendo uma das principais causas de sofrimento humano e de degradação da qualidade de vida. Muitos são os esforços para que se possa fazer o controle da dor. Entre eles, encontra-se a aplicação das terapias não convencionais, há muito tempo utilizadas nas culturas orientais, e que atualmente são uma realidade incontornável no universo dos cuidados de saúde. A procura da melhor evidência no controle da dor tem conduzido muitos pesquisadores à descoberta dos benefícios dessas terapias, para que possam ser associadas às terapêuticas já existentes, como mais um elemento que favoreça a busca de uma maior qualidade de vida.

Pacientes com câncer podem sofrer de muitas dores, provenientes de tensões musculares por conta das alterações psíquicas ou decorrentes da localização da doença.

Nocicepção são todas as respostas neurais que envolvem a dor. Todos os nociceptores são terminações livres sensíveis às moléculas de ATP (adenosina trifosfato), metabólitos celulares que são liberados devido à tensão ou lesão tecidual, com a ocorrência de isquemia e estímulo das terminações, provocando a sensação de dor.

As dores podem ser rápidas ou lentas. As primeiras terminam quando o estímulo é cessado. Já, no caso das segundas, geralmente há lesão tecidual, desencadeando uma hiperalgesia nos nociceptores próximos.

A sensibilidade nociceptiva é transmitida por fibras finas não mielinizadas. Essa transmissão ocorre de forma mais lenta do que a do estímulo do toque durante uma massagem, o que causa um bloqueio da dor. As manobras da massagem ajudam na remoção de agentes inflamatórios e na redução de pressão do edema, que são duas fontes causadoras de dor. Uma das principais ações da massagem sobre a dor é a liberação de endorfinas, como a histamina e a bradicinina, que atuam como analgésicos naturais. O aumento da serotonina também pode estar relacionado com a menor percepção de dor em pacientes com câncer.

Técnicas utilizadas

A utilização de massagem em crianças com patologia oncológica ainda não foi suficientemente estudada. O mito de que esse tipo de terapia pode contribuir para a disseminação de metástases tem sido um importante obstáculo à sua implementação.

As poucas evidências científicas existentes nessa área sugerem que há um efeito positivo das massagens em numerosas dimensões da sintomatologia física e/ou psicológica em crianças e adolescentes com diversos problemas de saúde. Contudo, os trabalhos com desenhos experimentais randomizados e controlados são escassos, as metodologias utilizadas são muito variadas e as crianças com patologia oncológica são um grupo pouco estudado.

A massagem utilizada em casos de câncer envolve a administração de combinações de manipulações físicas específicas aplicadas de forma sistemática aos tecidos moles do corpo, com intensidade, direção, velocidade e ritmo variáveis, para atender ao estado de saúde, aos resultados desejados e às preferências do terapeuta e do paciente.

A maioria dos terapeutas usa a massagem sueca, aplicando técnicas de effleurage, petrissage, fricções e compressões com pressão moderada. As manobras são aplicadas em combinação, predominando a effleurage, petrissage e amassamento digital. A effleurage pode ser aplicada em pernas, terminando com alongamento do tendão de Aquiles e movimentos circulares com dedos de tipo centrífugo.

Podem ser realizadas técnicas com pressão leve, moderada e firme. Estudos relatam também o uso das técnicas de percussão, de fricção e de mil mãos. Em alguns desses estudos, foram ainda citadas a acupressão e outras intervenções para a promoção da saúde, sem especificação da técnica de massagem ou local de aplicação.

Nota-se uma forte tendência de centralizar a aplicação em pernas, pés e braços. Mas também é realizada a sequência que envolve rosto, pescoço, ombros, costas, estômago, pernas, pés, braços e mãos. A massagem pode ainda ser aplicada nas costas, mãos, pernas e pés, incluindo rosto e braços. As intervenções geralmente duram quinze, vinte ou trinta minutos, podendo ser realizadas por enfermeiros ou massagistas com experiência. Os tipos de cânceres mais frequente são leucemia mieloide aguda (LMA), sarcomas e linfomas, linfoma de Hodgkin, tumores cerebrais, tumor de Wilms e sarcoma de Ewing.


Amauri Lima – Biomédico e professor do Departamento de Anatomia da Universidade Braz Cubas.

Mari Uyeda – Mestre em Ciências da Saúde, nutricionista e professora do Departamento de Ciências da Saúde da Pós-graduação da Universidade Nove de Julho.