Síndrome do ovário policístico e sua relação com o intestino

As atuais pesquisas sugerem que os bilhões de bactérias presentes no intestino humano, que são coletivamente chamadas de microbioma (ou microbiota) intestinal, têm um efeito significativo em nossa saúde.

Esses microrganismos podem controlar o sistema imunológico, a digestão, o sistema hormonal e o cérebro! O que é incrível, certo?

Por outro lado, à medida que aprendemos mais sobre a síndrome do ovário policístico (SOP), compreendemos que ela envolve mais do que apenas um desequilíbrio hormonal.

Nesse contexto, o propósito do estudo Alterations in gut microbiome composition and barrier function are associated with reproductive and metabolic defects in women with polycystic ovary syndrome (PCOS): a pilot study(3), foi verificar se havia uma conexão entre o microbioma do intestino e a síndrome do ovário policístico.

Especificamente, os pesquisadores observaram como o intestino permeável (condição em que bactérias e toxinas são capazes de “vazar” pela parede intestinal) e os lipopolissacarídeos (LPS) bacterianos afetam a inflamação, a resistência à insulina, o acúmulo de gordura e o hiperandrogenismo relacionados à SOP.

O que é a síndrome do ovário policístico

A síndrome do ovário policístico (SOP) é ​​uma condição de saúde da mulher que afeta tanto o sistema reprodutivo quanto o metabólico(1).

O diagnóstico de SOP varia tanto mais quanto nós aprofundamos nossos conhecimentos sobre essa síndrome na literatura científica.

Resistência à insulina e inflamação fundamentam tanto os casos de mulheres magras quanto os daquelas que apresentam dificuldades para a perda de peso na SOP(2).

Para emitir um diagnóstico formal de SOP, os médicos também procuram por hiperandrogenismo, oligovulação (ovulação irregular) ou anovulação (ausência de ovulação) e ovários policísticos na ultrassonografia(1).

O hiperandrogenismo pode ser observado visualmente pela presença de acne e crescimento de pelos no corpo (hirsutismo) da mulher. Entretanto, em casos mais sutis, só pode ser constatado por meio de exames laboratoriais.

Intestino e suas relações com a SOP

O estudo acima citado foi projetado para analisar vários fatores ao avaliar o intestino e sua conexão à inflamação e à síndrome do ovário policístico(3).

Como sugerido, foi constatado que havia marcadores significativamente mais altos de inflamação sistêmica em pacientes com SOP, especificamente leucócitos e linfócitos, que são glóbulos brancos do sistema imunológico.

Na observação exclusiva de inflamação no intestino, não houve diferença entre o grupo de teste e o grupo de controle, sendo que o biomarcador utilizado foi a calprotectina fecal.

Ao investigar a saúde dos intestinos, a presença da enzima diamina oxidase (DAO), que é um biomarcador para danos nas células do epitélio intestinal, foi maior em pacientes com SOP em comparação com o grupo de controle.

Além disso, o nível de zonulina, proteína que aumenta a permeabilidade das junções apertadas entre as células da parede do trato digestivo, também foi significativamente maior em pacientes com a síndrome.

Isso está relacionado à discussão citada no início deste artigo sobre lipopolissacarídeos (LPS) bacterianos e intestino permeável. Quando há um quadro de intestino permeável, também conhecido como hiperpermeabilidade intestinal, os LPS, que são uma toxina bacteriana, podem entrar na corrente sanguínea e causar uma inflamação, que é denominada como endotoxemia(4).

Curiosamente, o estudo mostrou que a biomarcação de LPS não era maior no sangue de mulheres com SOP.

O que isso significa? O LPS vem apenas de tipos específicos de bactérias. Portanto, mesmo que a pessoa tenha inflamação sistêmica resultante de partículas estranhas que entram na corrente sanguínea e de outras causas metabólicas, as bactérias que possuem o revestimento LPS não estariam presentes em grandes quantidades.

Isso é provável porque o estudo citado sugeriu ainda que havia menos diversidade no microbioma fecal de pacientes com síndrome do ovário policístico em comparação com as participantes do grupo de controle.

Essa descoberta sobre a menor diversidade no microbioma é importante porque outras pesquisas sugerem que precisamos ter não somente baixos níveis de ‘bactérias ruins’, mas também muitos tipos diferentes de bactérias benéficas para manter o metabolismo, a função imunológica e a função digestiva em seu melhor desempenho.

Portanto, aumentar a diversidade do microbioma intestinal pode ser um fator protetor na SOP.

Ovários policísticos: uma sindrome do corpo todo

Agora sabemos que a síndrome do ovário policístico pode estar relacionada ao fato de haver menos diversidade dentro do microbioma fecal (e, portanto,  do intestino).

Com base nisso e colocando-se ênfase no processo de cura, é possível dizer que o intestino pode ser benéfico para melhorar a diversidade de microrganismos e, portanto, melhorar os sintomas de SOP.

No final do dia, comer uma grande variedade de alimentos anti-inflamatórios e incrementar o consumo de alimentos fermentados pode ser muito útil tanto para aumentar a diversidade da microbiota intestinal quanto para diminuir a inflamação. Isso inclui o consumo de itens como kimchi, chucrute, kefir de água, kombucha, etc.

É preciso lembrar que a síndrome do ovário policístico não é apenas uma condição do ovário, mas sim que afeta o corpo todo. É esse tipo de abordagem no tratamento que trará os melhores resultados.


Diana Yedid – Diretora científica e administradora, na DYD Medicina Integrativa, em Milão, na Itália, atuando nas áreas de aconselhamento, formação, cursos, pesquisas e ensaios clínicos em obstetrícia, ginecologia, uroandrologia, pediatria, endocrinologia, gastroenterologia e neurologia. É especialista em Fitoterapia, Micronutrição, Terapia Floral e outras práticas integrativas.

 

Referências bibliográficas 

  1. Dumesic, D. A. et al. Scientific Statement on the Diagnostic Criteria, Epidemiology, Pathophysiology, and Molecular Genetics of Polycystic Ovary Syndrome. Endocr. Rev. 36, 487–525 (2015).
  2. Baptiste, C. G., Battista, M.-C., Trottier, A. e Baillargeon, J.-P. Insulin and hyperandrogenism in women with polycystic ovary syndrome. J. Steroid Biochem. Mol. Biol. 122, 42–52 (2010).
  3. Lindheim, L. et al. Alterations in Gut Microbiome Composition and Barrier Function Are Associated with Reproductive and Metabolic Defects in Women with Polycystic Ovary Syndrome (PCOS): A Pilot Study. PLoS One 12, e0168390 (2017). Disponível em https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0168390.
  4. Neves, A. L., Coelho, J., Couto, L., Leite-Moreira, A. e Roncon-Albuquerque, R. Metabolic endotoxemia: a molecular link between obesity and cardiovascular risk. J. Mol. Endocrinol. 51, R51-64 (2013).
  5. Effects of Mixed of a Ketogenic Diet in Overweight and Obese Women with Polycystic Ovary Syndrome. Disponível em https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/34886216/.
  6. He, F.-F. e Li, Y.-M. Role of gut microbiota in the development of insulin resistance and the mechanism underlying polycystic ovary syndrome: a review. J. Ovarian Res. 13, 73 (2020).
  7. Qi X. et al. The impact of the gut microbiota on the reproductive and metabolic endocrine system.
  8. Qi, X. et al. Gut microbiota-bile acid-interleukin-22 axis orchestrates polycystic ovary syndrome. Nat. Med. 25, (2019). Zhao, X. et al. Exploration of the Relationship Between Gut Microbiota and Polycystic Ovary Syndrome (PCOS): a Review. Geburtshilfe Frauenheilkd. 80, 161–171 (2020).
  9. Efficacy of multi-strain probiotic along with dietary and lifestyle modifications on polycystic ovary syndrome: a randomised, double-blind placebo-controlled study. Disponível em https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/35857132/.
  10. Fonte: https://www.sarahwilsonnd.com/blog/polycystic-ovarian-syndrome-pcos-start-gut.